O último dia do mês dedicado às missões faz a passagem para a festa de todos os santos. Como esquecer que a verdadeira santidade é aquela que se manifesta na vida dos/as missionários/as, daquelas pessoas que ousam sair do estreito limite dos seus interesses e aproximar-se solidariamente dos últimos; que deixam sua casa, família e amigos para tecer pacientemente os fios que fazem do mundo inteiro uma única família; que vão aos rincões mais distantes para levar a bandeira da paz; que são movidos por uma insaciável sede de justiça; que choram as dores dos povos de todas as cores e provam o fel da violência da perseguição; que transformam a terra pela mansidão? Celebremos e festejemos a alegria de participar de uma imensa caravana de homens e mulheres de todas as raças, nações e línguas que nos precede, nos acompanha e nos segue. E renovemos nosso desejo – que é também resposta a um chamado – de levarmos em nosso corpo as marcas de Jesus Cristo.
“Gente de todas as nações, tribos, povos e línguas”
No último dia 30 recordávamos os 30 anos do assassinato de Santo Dias da Silva, líder cristão e operário, e 463 anos da páscoa de Martinho Lutero, ex-monge católico e reformador da Igreja. Dois homens do seu tempo que, em diferentes lugares e circunstâncias, e também com métodos diferentes, sonharam e lutaram por uma sociedade mais justa e uma Igreja mais fiel a Jesus Cristo. Dois cristãos que tinham fome e sede de justiça e sofreram perseguição. Será que eles não fazem parte da imensa multidão de servos de Deus, cujas frontes foram marcadas com o sinal do Cordeiro?
A festa de todos os santos é a festa que faz memória dos/as esquecidos/as, daqueles/as que não têm um dia especial, nem um nome conhecido; daqueles/as que gastaram a vida no anonimato e cujos milagres não podem ser contabilizados pelas estreitas regras instituídas; de gente como Sepé Tiarajú, Padre Cícero, Romero, Adelaide; e mesmo de que não rezou pelo nosso catecismo, como Lutero, Luther King, Gandhi e tantos outros. É a festa que celebra a memória daqueles/a que nos antecederam na fé e cujo testemunho mantém a Igreja no caminho certo, apesar das suas resistências e ambivalências.
“Desde agora já somos filhos de Deus...”
Mas a celebração de todos os santos não olha somente para o passado. Ela é oportunidade e provocação para refletir sobre a vocação fundamental de todos os cristãos. Se é verdade que a santidade é um caminho estreito e uma vocação exigente, isso não significa que seja reservada a alguns grupos especiais de cristãos. Há mais de 40 anos o Concílio Vaticano II proclamava de forma clara e contundente, contra a idéia predominante, que a santidade não é privilégio dos sacerdotes e religiosos/as. Muito antes, a história já havia comprovado o que foi proclamado solenemente.
Na passagem do milênio, o saudoso João Paulo II provocava os cristãos a não se contentarem com pequenas medidas, com vôos rasantes, com ideais nanicos, e pedia que aspiremos nada menos e nada mais que à santidade. A vocação de todos precisa se transformar em desejo pessoal e em decisões e ações concretas. Como diz São João, nós somos chamados filhos/as de Deus e já o somos desde agora, mas o desafio é crescer na identificação com Jesus Cristo, trazer no corpo e na mente as marcas de Jesus Cristo. “Seremos semelhantes a ele...” E isso não é um simples sentimento.
“Felizes os pobres em espírito...”
Jesus Cristo é o verdadeiro e perfeito santo de Deus e, ao mesmo tempo, o caminho para a santidade. Não há santidade à margem do seguimento de Jesus Cristo, mesmo que tal seguimento seja implícito. Trata-se então de refazer o caminho prático trilhado por Jesus: “amar como Jesus amou; sonhar como Jesus sonhou; pensar como Jesus pensou; viver como Jesus viveu; sentir como Jesus sentia...” Este é o caminho para que, no meio e no fim do dia, no meio e no fim da vida, sejamos felizes. E Jesus propõe nas bem-aventuranças o caminho de santidade que ele mesmo percorreu.
A bela mensagem de Jesus que denominamos bem-aventuranças apresenta as diversas placas que indicam claramente o caminho da santidade. Jesus não fala de oito grupos de pessoas, mas de oito características daqueles/as que percorrem este caminho. E o caminho começa com a pobreza e termina com a perseguição, mas isso não é obstáculo, pois o Reino de Deus é antes de tudo – e no presente! – dos pobres e dos perseguidos. A consolação para os aflitos, a herança para os mansos, a saciedade para os famintos, a misericórdia para os compassivos, a visão de Deus para os puros e a filiação divina para os promotores da paz é promessa para o futuro, mas a alegria sem fim do Reino é experiência concreta dos pobres em espírito e dos perseguidos já no tempo presente.
A santidade à qual todos/as somos chamados/as tem a cara de discípulo, de despojamento solidário; o coração dos/as que se afligem e choram compassivamente as dores dos outros; o ritmo inquieto dos/as que anseiam e pela justiça plena e universal; o olhar terno da misericórdia; a transparência de quem evita a duplicidade e as segundas intenções; a ousadia daqueles/as que promovem a paz; a inegociável alegria de quem assume o custo de ser livre e libertador.
“Felizes os que têm fome e sede de justiça...”
Embora o conceito não goze de muita estima entre nós, os/as santos/as são beatos/as. E isso significa fundamentalmente que o caminho da santidade e o caminho para a felicidade coincidem. Santidade não rima com tristeza e fechamento em si mesmo, mas com felicidade e abertura aos outros. O caminho de Jesus Cristo, a vida e a espiritualidade cristã são propostas de uma felicidade que coincide com a realização da mais profunda vocação humana e que, por isso, é duradoura.
Assim, o caminho que nos conduz à santidade feliz e à felicidade santa está longe de ter as características da passividade ou do afastamento do mundo. Pelo contrário, passa pelo empenhativo distanciamento dos interesses individuais ou dos pequenos grupos; pela partilha da dor e humilhação dos outros; pela mortificante e vivificante fome e sede de justiça; pela prática perseverante da atenção aos mais frágeis; pela superação das palavras e ações ambíguas; pela ativa semeadura da paz em todas as relações; pela firmeza serena nas perseguições.
Está longe do Evangelho uma santidade que se resume em práticas de piedade. Está distante da essência humana uma felicidade baseada no sucesso pessoal e na indiferença em relação à sorte dos semelhantes. Aqueles/as que se vestem de branco e trazem palmas nas mãos são os/as vieram da grande tribulação, que lavaram suas vestes no sangue do Cordeiro, que recriaram sua ação libertadora, que encarnaram o Evangelho no mundo e na própria vida. Felicidade não significa ausência de dificuldades, mas realização plena da nossa vocação. Mais que perfeição, santidade é perseverança no amor e no serviço.
“Seremos semelhantes a ele...”
Jesus é o verdadeiro santo. A ele devemos o louvor, a glória, a sabedoria, a honra, o poder, a força e a ação de graças. A santidade que brilha no rosto, que atua nas mãos e pulsa no coração dessa multidão incontável que nos antecede e nos rodeia são frutos do Espírito de santidade e de verdade que Jesus Cristo derrama sobre a comunidade daqueles/as que o seguem. Se somos filhos/as e herdeiros/as, o somos por adoção e graça, e não por mérito pessoal ou direito adquirido.
A provocação pessoal de Jesus Cristo e o estímulo dessa multidão de vestes brancas que caminha alegre e jubilosa nos coloca e mantém no caminho da santidade. Que nossas roupas marcadas por griffes que diferenciam hierarquizam, sujas pela impureza do nosso pensar e pela ambigüidade do nosso agir, se igualem às do Cordeiro no talhe, na cor e no uso. Que nossas roupas sejam roupas de quem serve, sejam como as vestes de Jesus de Nazaré.
Peçamos a graça de estarmos sempre de pé diante do Cordeiro, rodeados por essa nuvem de testemunhas anônimas de todas as nações, tribos, raças e línguas. Superemos a maliciosa tentação de separar, catalogar e hierarquizar católicos e evangélicos, cristãos e não-cristãos. Que importância têm estas divisões para a eternidade? Permaneçamos de pé e com os rins cingidos, prontos/as para a travessia e para a luta. Que a nossa incrível capacidade de sofrer e nossa inexplicável alegria em meio às intermináveis lutas sejam nossas armas e nosso trunfo. E então estaremos viverendo em comunhão com os santos e santas de Deus.
Pe. Itacir Brassiani msf
“Gente de todas as nações, tribos, povos e línguas”
No último dia 30 recordávamos os 30 anos do assassinato de Santo Dias da Silva, líder cristão e operário, e 463 anos da páscoa de Martinho Lutero, ex-monge católico e reformador da Igreja. Dois homens do seu tempo que, em diferentes lugares e circunstâncias, e também com métodos diferentes, sonharam e lutaram por uma sociedade mais justa e uma Igreja mais fiel a Jesus Cristo. Dois cristãos que tinham fome e sede de justiça e sofreram perseguição. Será que eles não fazem parte da imensa multidão de servos de Deus, cujas frontes foram marcadas com o sinal do Cordeiro?
A festa de todos os santos é a festa que faz memória dos/as esquecidos/as, daqueles/as que não têm um dia especial, nem um nome conhecido; daqueles/as que gastaram a vida no anonimato e cujos milagres não podem ser contabilizados pelas estreitas regras instituídas; de gente como Sepé Tiarajú, Padre Cícero, Romero, Adelaide; e mesmo de que não rezou pelo nosso catecismo, como Lutero, Luther King, Gandhi e tantos outros. É a festa que celebra a memória daqueles/a que nos antecederam na fé e cujo testemunho mantém a Igreja no caminho certo, apesar das suas resistências e ambivalências.
“Desde agora já somos filhos de Deus...”
Mas a celebração de todos os santos não olha somente para o passado. Ela é oportunidade e provocação para refletir sobre a vocação fundamental de todos os cristãos. Se é verdade que a santidade é um caminho estreito e uma vocação exigente, isso não significa que seja reservada a alguns grupos especiais de cristãos. Há mais de 40 anos o Concílio Vaticano II proclamava de forma clara e contundente, contra a idéia predominante, que a santidade não é privilégio dos sacerdotes e religiosos/as. Muito antes, a história já havia comprovado o que foi proclamado solenemente.
Na passagem do milênio, o saudoso João Paulo II provocava os cristãos a não se contentarem com pequenas medidas, com vôos rasantes, com ideais nanicos, e pedia que aspiremos nada menos e nada mais que à santidade. A vocação de todos precisa se transformar em desejo pessoal e em decisões e ações concretas. Como diz São João, nós somos chamados filhos/as de Deus e já o somos desde agora, mas o desafio é crescer na identificação com Jesus Cristo, trazer no corpo e na mente as marcas de Jesus Cristo. “Seremos semelhantes a ele...” E isso não é um simples sentimento.
“Felizes os pobres em espírito...”
Jesus Cristo é o verdadeiro e perfeito santo de Deus e, ao mesmo tempo, o caminho para a santidade. Não há santidade à margem do seguimento de Jesus Cristo, mesmo que tal seguimento seja implícito. Trata-se então de refazer o caminho prático trilhado por Jesus: “amar como Jesus amou; sonhar como Jesus sonhou; pensar como Jesus pensou; viver como Jesus viveu; sentir como Jesus sentia...” Este é o caminho para que, no meio e no fim do dia, no meio e no fim da vida, sejamos felizes. E Jesus propõe nas bem-aventuranças o caminho de santidade que ele mesmo percorreu.
A bela mensagem de Jesus que denominamos bem-aventuranças apresenta as diversas placas que indicam claramente o caminho da santidade. Jesus não fala de oito grupos de pessoas, mas de oito características daqueles/as que percorrem este caminho. E o caminho começa com a pobreza e termina com a perseguição, mas isso não é obstáculo, pois o Reino de Deus é antes de tudo – e no presente! – dos pobres e dos perseguidos. A consolação para os aflitos, a herança para os mansos, a saciedade para os famintos, a misericórdia para os compassivos, a visão de Deus para os puros e a filiação divina para os promotores da paz é promessa para o futuro, mas a alegria sem fim do Reino é experiência concreta dos pobres em espírito e dos perseguidos já no tempo presente.
A santidade à qual todos/as somos chamados/as tem a cara de discípulo, de despojamento solidário; o coração dos/as que se afligem e choram compassivamente as dores dos outros; o ritmo inquieto dos/as que anseiam e pela justiça plena e universal; o olhar terno da misericórdia; a transparência de quem evita a duplicidade e as segundas intenções; a ousadia daqueles/as que promovem a paz; a inegociável alegria de quem assume o custo de ser livre e libertador.
“Felizes os que têm fome e sede de justiça...”
Embora o conceito não goze de muita estima entre nós, os/as santos/as são beatos/as. E isso significa fundamentalmente que o caminho da santidade e o caminho para a felicidade coincidem. Santidade não rima com tristeza e fechamento em si mesmo, mas com felicidade e abertura aos outros. O caminho de Jesus Cristo, a vida e a espiritualidade cristã são propostas de uma felicidade que coincide com a realização da mais profunda vocação humana e que, por isso, é duradoura.
Assim, o caminho que nos conduz à santidade feliz e à felicidade santa está longe de ter as características da passividade ou do afastamento do mundo. Pelo contrário, passa pelo empenhativo distanciamento dos interesses individuais ou dos pequenos grupos; pela partilha da dor e humilhação dos outros; pela mortificante e vivificante fome e sede de justiça; pela prática perseverante da atenção aos mais frágeis; pela superação das palavras e ações ambíguas; pela ativa semeadura da paz em todas as relações; pela firmeza serena nas perseguições.
Está longe do Evangelho uma santidade que se resume em práticas de piedade. Está distante da essência humana uma felicidade baseada no sucesso pessoal e na indiferença em relação à sorte dos semelhantes. Aqueles/as que se vestem de branco e trazem palmas nas mãos são os/as vieram da grande tribulação, que lavaram suas vestes no sangue do Cordeiro, que recriaram sua ação libertadora, que encarnaram o Evangelho no mundo e na própria vida. Felicidade não significa ausência de dificuldades, mas realização plena da nossa vocação. Mais que perfeição, santidade é perseverança no amor e no serviço.
“Seremos semelhantes a ele...”
Jesus é o verdadeiro santo. A ele devemos o louvor, a glória, a sabedoria, a honra, o poder, a força e a ação de graças. A santidade que brilha no rosto, que atua nas mãos e pulsa no coração dessa multidão incontável que nos antecede e nos rodeia são frutos do Espírito de santidade e de verdade que Jesus Cristo derrama sobre a comunidade daqueles/as que o seguem. Se somos filhos/as e herdeiros/as, o somos por adoção e graça, e não por mérito pessoal ou direito adquirido.
A provocação pessoal de Jesus Cristo e o estímulo dessa multidão de vestes brancas que caminha alegre e jubilosa nos coloca e mantém no caminho da santidade. Que nossas roupas marcadas por griffes que diferenciam hierarquizam, sujas pela impureza do nosso pensar e pela ambigüidade do nosso agir, se igualem às do Cordeiro no talhe, na cor e no uso. Que nossas roupas sejam roupas de quem serve, sejam como as vestes de Jesus de Nazaré.
Peçamos a graça de estarmos sempre de pé diante do Cordeiro, rodeados por essa nuvem de testemunhas anônimas de todas as nações, tribos, raças e línguas. Superemos a maliciosa tentação de separar, catalogar e hierarquizar católicos e evangélicos, cristãos e não-cristãos. Que importância têm estas divisões para a eternidade? Permaneçamos de pé e com os rins cingidos, prontos/as para a travessia e para a luta. Que a nossa incrível capacidade de sofrer e nossa inexplicável alegria em meio às intermináveis lutas sejam nossas armas e nosso trunfo. E então estaremos viverendo em comunhão com os santos e santas de Deus.
Pe. Itacir Brassiani msf
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