quinta-feira, 21 de abril de 2011








AS MULHERES VIGIAM
Elas acompanhavam de longe...
Observavam com os olhos do coração...
Deram sumiço a Jesus...
Uma pedra esconderá tudo para sempre?!
Anoitece, escurece, recolhem-se...
Amanhã? Tudo foi um sonho!
Cairá no esquecimento tudo o que Ele disse e fez....
AS MULHERES VIGIAM,
Atentas, acordadas, solidárias, atrevidas, sozinhas!
Já é madrugada... a luz do sol logo aparecerá,
a noite da discriminação já está chegando ao fim.
A fortaleza delas se alimenta na raiz da exclusão excluída.
AS MULHERES VIGIAM,
OS DISCÍPULOS DORMEM!
“Quem vai tirar a pedra?”
Quem tira a pedra é a força que nasce do sepulcro vazio,
do medo que morreu, do susto que não existe mais...
“Agora vocês devem ir e dizer aos discípulos,”
- dorminhocos, medrosos, valentes, ressuscitados -
que mulheres e homens, somando as vidas,
continuam a missão do RESSUSCITADO
NO REINO DA LIBERTAÇÃO DO PLANETA. (cf.Mc 15,40;16,1-8)
Ir.Cláudia Corteze

Encontro de Espiritualidade da Vida Religiosa Inserida

Religiosos(as) do Rio Grande do Sul se encontraram nos dias 15 a 17 de Abril, na casa de encontro das Irmãs Palotinas para refletir,

Passar da Celebração na igreja para a ação na vida

Hoje celebramos a Aliança nova e eterna que Deus renova conosco, seu povo amado, família na qual seu Filho se faz irmão. A mesa está pronta, a toalha está linda, as flores estão coloridas e o alimento é simples e saboroso. E há lugar para todos/as, inclusive para pecadores/as como nós. O próprio Jesus nos diz que preparou e desejou ardentemente celebrar esta ceia conosco. E aqui a acorremos porque intuímos que não temos outra honra ou glória que esta de trazer em nossos sonhos, projetos, ações e relacionamentos as marcas da cruz de Cristo, do seu amor sem fronteiras. Aqui estamos para ouvir de novo as palavras do seu testamento, para provar mais uma vez como ele nos ama, para continuar o dinamismo da sua missão no mundo. Ele acolhe os frutos da terra e do nosso trabalho e os transforma em sinais do seu amor e da sua presença, para nos lembrar que em cada criatura que habita este Planeta brilha um raio da sua beleza.


“Este dia será para vós uma festa memorável...”
Na mesa que reúne as pessoas que desejam ardentemente viver a fraternidade, fazemos memória, recordamos. Com o povo de Israel e todos os povos, trazemos de novo ao coração as inúmeras travessias já realizadas ou ainda em processo: travessias com avanços e retrocessos, quedas e recomeços, sonhos e traições; travessias marcadas por uma Presença que se mostra, ao mesmo tempo, como nuvem luminosa e como sombra acolhedora; travessias nas quais damos o melhor que podemos para que as dores de agonia da Terra se transformem em gemidos de parto.
Esta celebração é também um memorial dos êxodos e travessias que somos convidados/as a empreender como indivíduos: travessias de um eu fechado em si mesmo para uma comunidade aberta e solidária; de uma mesa grande e vazia para uma mesa farta e partilhada; de projetos estreitos e ancorados no sucesso pessoal para utopias coletivas; da sedução indisfarçável que a riqueza exerce sobre nós ao despojamento livre e generoso em favor dos outros; de lutas empreendidas contando apenas conosco mesmos/as para alianças bem mais que estratégicas.
A ceia eucarística é a memória de Jesus e dos discípulos e discípulas que, tendo atrás as memoráveis experiências das refeições partilhadas com toda sorte de pecadores/as e à frente a ameaça dos poderes que não toleram mudanças, compartilham suor e sangue, vinho e pão, sonhos e esperanças. Memória de incompreensões, medos, distanciamentos e traições. Memória daquele que tendo nos amado, ama-nos até o fim e se oferece como perene alimento para a caminhada. Memória de um Planeta-Mãe que nos gera e alimenta nas suas próprias entranhas, mas é agredido violentamente.


“Isto é o meu corpo que é dado por vós!”
A eucaristia é alimento para quem está a caminho. Celebramos esta ceia e aceitamos a aliança que Deus nos oferece ainda “na terra do Egito”. Faz escuro, mas cantamos para despertar a aurora que não demora a surgir. Celebramos esta refeição de comunhão prontos/as para realizar uma travessia urgente: com cintos que diminuem os embaraços; com sandálias que agilizam os passos; com cajados que nos sustentam nos vales escuros. “Quem comeu de pé a páscoa não tem lucros, nem tem medo”, poetiza o velho e lúcido Dom Pedro Casaldáliga.
Não um cordeiro, mas um corpo feito inteiramente dom. Corpo não é apenas uma carcaça, a metade exterior e mais desprezível da pessoa: é a totalidade concreta, é diferença e relação. Jesus Cristo oferece a concretude da sua vida como dom e partilha. É sua vida inteira – sonhos, ações, corpo e sangue – que ele nos dá sem reservas e sem impor condições. E o faz numa ceia ordinária, numa refeição marcada pelo afeto fraterno, num contexto de ameaça de morte, pedindo insistentemente que façamos o mesmo para manter viva sua memória. Ele nos dá um exemplo.
A Eucaristia faz da Igreja uma comunidade aberta em dom àqueles/as que estão fora ou longe. O corpo de Cristo é a comunidade viva dos fiéis, o povo de Deus que ultrapassa as fronteiras eclesiásticas, o corpo dos pobres e marginalizados que padecem suas chagas vivas, o corpo do nosso Planeta, tão generoso e tão agredido. O corpo-Igreja é dado por nós, para que sejamos homens e mulheres emancipados, maiores, maduros e livres como Cristo. E isso significa encarnar a mesma atitude fundamental de amor, de cuidado e de serviço, sem esquecer do protesto profético contra as injustiças, como o assassinato brutal do índio Gaudino, no dia dos índios em 1997 (21 de abril).



“Senhor, tu me lavas os pés?”
Jesus simboliza a oferta sem reservas de si no gesto de lavar os pés dos discípulos. Ele havia dito e repetido que viera para servir e não para ser servido, como Servo e não como Senhor, e demonstrara isso numa dedicação sem cansaço aos últimos. Por isso, depois de repartir pão e vinho, deixa a mesa e assume o serviço que cabia às mulheres e crianças: lava os pés dos que estavam com ele à mesa. É o próprio Deus que se inclina diante da humanidade e, de joelhos, lava seus pés. E não o faz para demonstrar humildade, mas para desfazer as hierarquias e afirmar a absoluta igualdade de todos/as.
Entre os convivas estão Pedro e Judas. Pedro reage diante da lição de Jesus. Não lhe parece bem mudar as coisas de forma tão radical: para ele, senhores e superiores devem ser honrados; servos e inferiores devem ser desfrutados; esta é a ordem e nada deve ser mudado. Parece-lhe difícil aceitar que esta não é a ordem querida por Deus, que participar da Eucaristia implica em fazer-se memória viva de Jesus Servo. Como custa à Igreja e a cada um/a de nós assimilarmos esta lição!... Mas Jesus não encena uma peça: ele é o Servo, e a missão que compartilha conosco é o serviço aos irmãos.
O evangelista não diz quem foi o primeiro e quem foi o último, e Jesus lava os pés também de Judas. Nossa tradição cultural propõe a prática de ‘malhar o Judas’, mas Jesus nos ensina a acolher também àqueles/as nos quais se condensa a resistência ao amor e o mistério da iniqüidade. Não se trata de absolver os algozes e ignorar seus crimes, mas de ser capaz de ver, mesmo nas pessoas contraditórias, resistentes e errantes, um ser humano que necessita de respeito. E mais: precisamos acolher a possibilidade de resistência, fechamento e traição que está em de nós mesmos/as.

“Elevo o cálice da salvação invocando o nome santo do Senhor...”
A lição é difícil e pouco óbvia. É por isso que depois de cear e de lavar os pés dos discípulos, Jesus os interroga: “Compreendeis o que acabo de fazer?” E para não deixar dúvidas, explica: “Vós me chamais de mestre e senhor e dizeis bem, pois eu o sou. Portanto, se eu, o Senhor e mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros.” Deus coloca tudo em suas mãos, e este tudo se mostra nas mãos que lavam os pés e serão pregadas na cruz, no serviço cordial e fraterno, na recusa de toda espécie de hierarquização.
Seu desejo e ordem é que passemos da memória verbal e ritual à realização histórica e vivencial: “Fazei isso em memória de mim”; “Se puserdes em prática, sereis felizes.” A Eucaristia é memorial da solidariedade de Jesus realizada efetivamente nos caminhos da Galiléia e no martírio da cruz. Sem isso, a santa ceia seria um rito belo, mas vazio. Precisamos dar conteúdo e concretude à Eucaristia no dom cotidiano pelos outros, no serviço despojado a todos/as, mesmo àqueles/as que aparentemente não o merecem. O critério da missão não é o merecimento e sim a necessidade.
Jesus de Nazaré nos convida à Ceia que preparou com cuidado de amigo e nos acolhe à sua mesa. Participemos dignamente desta ceia-aliança para alcançarmos um amor maduro e concreto. Sentados/as, como pessoas reconhecidas e dignas, ou em pé, como militantes prontos/as para a luta, descubramos que a vida de cada pessoa humana é muito preciosa aos olhos de Deus. Por isso, seguros/as do seu amor, tomemos o avental e lavemos os pés uns dos outros, no interior do templo e nos caminhos da história.

“Vou cumprir minhas promessas ao Senhor n presença de seu povo reunido.”
Deus Pai e Mãe: teu Filho nos ensinou que na tua mesa há lugar para todos e não falta alimento, porque tudo é partilhado. Muito obrigado porque hoje, mais uma vez, vimos que isso é verdade. Mas te agradecemos principalmente porque nesta mesa de irmãos e irmãs aprendemos até onde nos leva o amor. Queremos te agradecer também pelos dons inestimáveis que são a terra, o ar, a água e todas as espécies de flores e frutos que possibilitam nossa vida de todos os dias e, inclusive, esta eucaristia. E te pedimos que nos mantenhas na escola do teu filho, para que aprendamos a fazer o que ele fez, a amar como ele amou, a servir como ele serviu. Assim seja!
Pe. Itacir Brassiani msf

quinta-feira, 14 de abril de 2011

OS 7 "Cês" MAIS NECESSÁRIOS NA VIDA FRATERNA*

A propósito de uma contínua reflexão sobre a dinâmica da vida fraterna comum e seus novos desafio;

Cyzo Assis Lima,fpm


A Vida Fraterna – VF - é uma graça de Deus acima de tudo. Muitas vezes perdemos esta consciência na nossa própria forma de viver e ser na comunidade de vida comum. Há poucos dias uma jovem muito entusiasmada e motivada para consagrar sua vida a Deus me disse de forma muito bonita: “Acho lindo como vejo o relacionamento entre vocês, os membros da Comunidade. Sinto que são de fato uma família, irmão e irmãs que se amam e se apóiam uns nos outros”. Essa jovem sem saber está falando de uma linda página do evangelho: “VÓS SOIS IRMÃOS” nos diz Jesus. (Mt 23,8). Apresento esta pequena e modesta reflexão quanto aos 7 Cs mais importantes/necessários na vida de irmãos e irmãs que se dispõem a caminhar juntos no serviço diário do Senhor do Reino e no Reino do Senhor. Naturalmente que a escrevo a partir do contexto de nossa vida e missão enquanto um carisma novo na Igreja e de vida fraterna mista. Talvez este texto seja melhor dirigido aos que estão no estágio formativo, especialmente no Noviciado ou Juniorado.


“Vede: como é bom, como é agradável habitar todos juntos, como irmãos. É como o óleo fino sobre a cabeça, descendo pela barba, a barba de Aarão, descendo sobre a gola de suas vestes. É como o orvalho do Hermon, descendo sobre os montes de Sião; Porque aí manda Javé a bênção, a vida para sempre” - Salmo 133, 1-3

1º “C” = CORAGEM

“Coragem! Ele te chama. Levanta-te!” - Marcos 10, 49-52

É preciso estar tomado pelo Espírito de Deus, pelo DOM da Coragem que vem direto do Espírito Santo para de fato consagrar a vida pessoal num caminho comunitário, com seus altos e baixos. A coragem aqui requer lucidez – dez luzes – e a pessoa não pode estar inserida numa espécie de “nuvem escura” onde caminha com insegurança, insatisfações e até mesmo medo. Sem a coragem que vem do mais profundo da pessoa, ela será sempre uma pessoa permanentemente insatisfeita dentro da vida fraterna. Não se joga prá valer para ser irmão ou irmã dos outros. Sempre vai ter uma espécie de “concessão ou negociação”, como se o ser irmão, na ótica do evangelho, fosse algo a ser negociado.

O ser irmão ou irmã é um projeto de amor e o amor requer coragem. A Bíblia está cheia de experiências humanas de coragem e encorajamento de uns aos outros na construção fantástica do tornar-se irmão por causa do amor de Deus derramado nos corações. Continua sendo um testemunho que fala alto e também um mistério a vida fraterna numa cultura que lança milhões no individualismo e até mesmo no mais doentio egocentrismo. Sem uma boa dose de coragem evangélica jamais alguém tornará irmão ou irmã numa comunidade de vida fraterna.

Há lindas experiências humanas na Igreja carregadas da mais fantástica beleza da fraternidade vivida numa autêntica irmandade/sororidade. Infelizmente também a Igreja torna-se espaço para vidas doentias, sofridas e que se tornam amargas, autoritárias, pesadas, por não serem vividas na dimensão evangélica do ser com os outros e para os outros. Sem ser irmão ou irmão na vida fraterna-comum, vive-se uma contínua tensão ou dualidade que leva à insatisfação contínua e infelicidade humana.

Em marcos 10,49-52 Jesus está em plena construção do seu movimento discipular. Ele chama pessoas para integrarem a experiência do seguimento onde a partilha da vida, das esperanças e de tudo que daí deriva é fundamento primeiro. Entrar no movimento de Jesus é assumir a nova identidade do ser irmão dos que estão com Jesus. Esta dinâmica escapa aos “caprichos” humanos e torna-se 100% divina, pois é o Senhor que chama e organiza em torno de SI seus amigos e os levam a uma comunidade de irmãos em prol do Reino.

2º “C” = CONVERSÃO

“Quem és tu Senhor?” E a resposta: “Eu sou Jesus, a quem tu estás perseguindo” Atos 9, 5

Só se torna verdadeiramente irmãos e irmãs quem interiormente deixou-se trabalhar pela Palavra de Deus, fazendo um sincero processo de conversão humana e espiritual. Sem conversão não se pode tornar-se irmãos e irmãs. Há muitas comunidades religiosas onde os membros são apenas “irmãos de mentirinha” e num plano apenas teórico.

A práxis fraterna requer a capacidade de “carregar” uns aos outros nas alegrias e nas tristezas, nos fracassos e nas vitórias. Sem um coração e uma mente convertidos a um amor profundo e ilimitado, a uma relação amorosa com quem eu acolhi no meu coração como meu irmão ou minha irmã, vive-se apenas uma vida de contínuas tensões e perdas de energias, onde quase não reina a harmonia e a alegria fraternal. Em tal comunidade mais se tem velas “funerais” de choro que “fogos” de alegria e festa;

Jesus lutou firmemente e decididamente para que seus discípulos aprendessem o difícil e fantástico caminho do ser irmão entre eles. Quando Ele diz: ”Vos sois irmãos”!, na verdade está dizendo: “agora vocês tem uma nova identidade”. Esta identidade nova torna vocês mais humanos, mais divinos e melhores pessoas e tem todos um mesmo Pai, um mesmo caminho e uma mesma paixão: O Reino de Deus. A conversão à alteridade precisa de certo tempo e de um processo onde muitos e importantes suportes devem ser levados em conta. Mas o principal está no coração de cada pessoa que de fato assume o aprendizado e a alegria do acolher em si o outro ou a outra como parte de si mesmo e dádiva que o Bom Deus, o querido ABBA, presenteia. Não há dinheiro suficiente que paga a beleza em poder abraçar-nos como verdadeiros irmãos e irmãs no Nome e na causa do Senhor.

Conversão à Fraternidade é mais difícil que conversão à luta pela justiça ou a algo equivalente. A Fraternidade na mutualidade exige entrega total, transparência, ascese contínua e interminável. Conforme eu me adentro na relação mais profunda com os demais em torno de mim vou paralelamente adentrando a mim mesmo no meu eu mais profundo também. Às vezes não queremos descer em nossos “porões” e tememos ver por lá algo que uma vez “conhecido” precisará ser também “mostrado”. A quem mostrar? Certamente para aqueles que confiamos e com quem já construímos uma evangélica cumplicidade fraterna. Na caminhada para a vida fraterna autentica nos tornamos também mais evangelizados e por isso mesmo mais verdadeiros.

3º “C” = COMUNICAÇÃO

“Eu e o Pai somos um!” João, 10,30

Na comunicação os seres humanos se completam e buscam juntos o sentido maior para a existência. Jesus foi comunicação viva com seus discípulos, com o povo que o seguia e especialmente com os pobres e sofredores com os quais Ele sempre buscava ter proximidade. Proximidade requer comunicação liberta, adulta, e tal comunicação leva à proximidade maior. Cria-se um ciclo fraterno-saudável.

Na vida fraterna o diálogo maduro, respeitoso e fluente é fundamental para a boa qualidade da própria vida dos membros. Como irmãos e irmãs não podemos viver com um diálogo medíocre, pobre e com contínuas interrupções. Na vida de irmãos/ãs não deve reinar jamais um dia de silêncio enquanto mudez, fechamento ou mesmo empobrecimento do diálogo. Espíritos libertados têm na comunicação e no contato humano as duas asas para que se façam vôos mais altos e mais nobres.

Acontece que a comunicação é uma arte que se aprende e não se adquiri por mérito pessoal. Nós humanos precisamos ser ajudados para que possamos falar no nosso inicial processo de apoderação da linguagem. Muito da comunicação na vida adulta tem a ver com o processo vivido onde os pais acertaram mais ou menos no ensino da linguagem e da comunicação baseada em valores e imagens portadoras de alegria, co-responsabilidade, educação e harmonização. Pessoas que se ferem facilmente e se fecham por quase nada tem um déficit não trabalhado na sua primeira infância quando aprenderam a falar. Há também um processo de “aprender a falar” no plano espiritual e da vida fraterna, mesmo quando se vai ficando adulto.

A linguagem de irmãos e irmãs em Nome do Senhor deve ser baseada em conteúdos onde os valores do Reino de Deus estão sempre presentes. Uma sadia comunicação na comunidade de vida fraterna eleva os espíritos dos membros e torna possível a eles acertar mais em tudo o que fazem juntos. Jesus primou sobremaneira na comunicação com seu discipulado. Na verdade Ele era/é a verdadeira comunicação de Deus. Cristo usava imagens que elevava os espíritos dos mesmos e trazia a eles uma sabedoria natural.

A comunicação é pobre quando gira mais em torno de sub-cultura ou em torno de temas que nada acrescentam à inteligência e à interioridade das pessoas. No período da formação sempre peço e insisto que os formandos e/ou formandas cuidem do conteúdo de suas falas. Falas com pobre ou infantilizado conteúdo não somam para uma comunicação madura e fecunda; Falas que sempre partem do negativo, da sub-cultura ou mesmo de fofocas intermináveis mostram que a comunicação não está fundamentada na Pessoa de Jesus e no seu evangelho, mas em deformidades do espírito e do caráter. Pessoas com tais deformidades podem ser curadas e devem ser ajudadas. Mas elas precisam esforçar-se mais do que pensam e caso não vençam tal comunicação baseada mais na “baixeza” que na elevação e na plenitude do humano e do Espírito, devem necessariamente deixar a vida fraterna, pelo simples fato de não poder dignificá-la e elevá-la humana e espiritualmente. O diálogo é uma relação em dois e na língua portuguesa esta palavra tem em si duas construções muito lindas: DIA – claridade, sol, visão, harmonia... – e LOGO – palavra, expressão viva e livre, conteúdo dito... ;

4º “C” = CORAÇÃO

«A multidão dos que haviam abraçado a fé tinha um só coração e uma só alma” Atos 4, 32

Na comunidade de vida fraterna o centro é o coração. Coração como aquele órgão que irradia sangue, vida, que bate ininterruptamente garantido um ritmo de amorização permanente entre os membros. A vida fraterna pode muitas vezes está tão somente no plano da “cabeça”, do mero racional, formal, calculista, mecanizado e por isso mesmo com alto risco de neurotização. Às vezes a comunidade é bonitinha, arrumadinha, asséptica e até mesmo passa a imagem de uma “comunidade perfeita”. Mas por detrás disso tudo podem estar pessoas sofridas por pouca amorização e com um coração “dilatado”, sem força e sem capacidade de “enviar sangue” renovado a cada um dos seus membros.

Uma comunidade fraterna “sem coração” deve até mesmo fazer Deus sofrer, quanto mais os seus próprios membros. Aqui se precisa muito do Espírito Santo, que é mestre em amorização para que a vida fraterna seja centrada num saudável coração capaz de amar e fazer-se amar. O coração da comunidade fraterna precisa do oxigênio da saudável “cumplicidade” entre os seus membros. Mexeu com um mexeu com todos. Um membro sofre, todos sofrem. Um membro alegra-se, todos se alegram. Um membro adoece, todos sentem. Um membro se cura, todos celebram; Há um centro vital na vida fraterna que se dá como o “coração” entre os membros que de fato se amam;

Está associado ao coração também a dimensão da interioridade da espiritualidade. É também o coração – da comunidade e dos membros individualmente – o lugar de acolhida da Palavra de Deus, da Eucaristia e da caridade fraterna e das lutas solidárias. Uma comunidade assídua à oração, à escuta e à interioridade da Palavra de Deus e que cultiva a dimensão da partilha em vários níveis, será de fato lugar de bênção e de fecunda missão. Passa pelo coração uma séria e viva espiritualidade. Por isso que o coração está no centro da vida fraterna. Dele irradia-se luz e força para as outras dimensões da comunidade, da vida e da missão. Esforçamo-nos para que o nosso coração humano e o coração comunitário sejam mais parecidos com o grandioso coração de Jesus, cheio da beleza do mais puro amor destinado primeiramente aos seres humanos.

5º “C” = COMPROMISSO

“Ainda que para outros eu não seja apóstolo, para vós, ao menos, o sou; pois o ‘SELO’ – compromisso – do meu apostolado sois vós, no Senhor” 1º Coríntios 9, 2

Quando numa comunidade fraterna não existe claramente a aliança de amor, o SELO = PACTO, compromisso, adesão mútua, co-responsabilidade, tem-se uma comunidade “manca das pernas” e que não chegará a lugar nenhum e se chegar chegará com um custo muito alto de muitos machucados. A relação das pessoas no mundo secular dá-se por áreas de interesse. A mentalidade sempre é: “Eu ajudo, mas quero ser ajudado”ou “eu dou algo, mas preciso ser recompensado”. Raramente se vê a mútua colaboração própria de irmãos e irmãs.

Na vida fraterna a colaboração mútua é uma das principais colunas de sustentação da comunidade de vida. Pessoas que não sabem colaborar, servir, ajudar, amar, fazendo, e fazendo amando, não deveriam estar na Vida Consagrada. Em Jesus vemos o melhor exemplo de dádiva ilimitada aos seus irmãos e ao Pai. Podemos entender hoje colaboração mútua como “parceria na mesma causa e na mesma casa”; Somos parceiros, somos parte uns dos outros, em Nome do Senhor Jesus.

Pela colaboração mútua se faz grandes milagres e se alcança lindas vitórias. A própria vida religiosa tem tantos e fantásticos exemplos neste sentido. Mas tem também muito de dor e sofrimento, quando pessoas, que chamamos de “malas sem alça” apenas são sugas-sugas da comunidade e não ativas colaboradoras da mesma. Na colaboração se dividirá os fardos uns dos outros, se aperfeiçoará tempo e espaço para o bem de todos e se faz uma comunidade mais leve e por isso mesmo mais autêntica.

Quando pessoas não são capazes de assumirem um compromisso mútuo e com fraterna seriedade, não são aptas para a vida comunitária fraterna. Passam a ESTAR juntas sem SER juntas. É o SER IRMÃOS que interessa a Jesus no final de tudo.

Há casos de pessoas na Vida Consagrada que fazem os votos “só para” Deus. Elas acham que Deus vai estar ao lado da cabeceira da cama quando caírem gravemente enfermas. Acham que Deus vai à justiça tomar a defesa delas quando por ventura caiam em alguma armação/tentação/injustiça. Acreditam que Deus vai lutar cada dia para que não falte a elas o pão, o remédio, a segurança pessoal e tantos outros cuidados. Deus fará tudo isso e muito mais através dos irmãos e irmãs, pois esta é a única forma que Ele tem para agir em prol dos que a Ele consagram suas vidas. Daí a importância da compreensão horizontal dos votos e não apenas a limitada visão verticalista dos mesmos.

Consagramo-nos a Deus na Igreja. Igreja aqui é compreendida como a comunidade de irmãos e irmãs na mesma fé e reunida em torno da Pessoa do Senhor de nossas vidas: Jesus Cristo. Professamos cada vez: Ele está no meio de nós! Consagração “só a Deus” é anti-comunhão e vai ao desencontro de toda a significância evangélica dos Conselhos Evangélicos;

Num campo de batalha os soldados fazem um pacto que nunca é rompido: caso alguns deles sejam atingidos e não morram, mas ficam gravemente feridos, sem puderem se locomover sozinhos, que possam contar que os companheiros os pegarão e levarão para fora da linha de fogo, salvando ainda suas vidas. Há inúmeros relatos de heroísmos de soldados que colocam sobre os ombros companheiros quase mortos e os carregam em meio ao fogo cruzado para deixá-los seguros. Há ali uma aliança verdadeiramente fraternal.

Mais aliança deveria haver entre os que consagram suas vidas ao Senhor da Vida e que precisam cada dia também “carregar seus próprios irmãos” das mais diferentes formas. O amor que o soldado “salvador” tem pelos seus companheiros de luta é algo que deve tocar a vida de quem não precisa correr risco nenhum para amar/carregar seus próprios irmãos;

Por fim, o “C” de compromisso é também o compromisso que a Comunidade Fraterna deve ter com o Reino de Deus – Lucas 4,14-22ª -. É difícil conceber uma comunidade de vida comum, onde seus membros se dizem irmanados entre si sem um compromisso visível, notório e prático com a dimensão da solidariedade, da missão evangelizadora e da justiça social. Caso torne-se uma comunidade de pessoas que se amam e se apóiam mas que teimam em manter-se fechada das lágrimas e gemidos da humanidade, tem-se certamente um clube e não uma comunidade evangélica. Irmão de verdade não me deixa na acomodação ou na omissão. Irmãos de verdade me levam a um compromisso reinocêntrico que farei também em nome deles.

6º “C” = CONTENTAMENTO

“Alegrai-vos sempre no Senhor; outra vez digo, alegra-vos! Filipenses 4:4

Deve ser trágica uma vida em que a maior parte do tempo é feita sem contentamento = alegria. A falta da alegria leva a baixar nossas defesas e logo nos vemos doentes, melancólicos e até mesmo deprimidos; Aqui não se fala da alegria fugaz que o mundo dá. De uma alegria que gira em torno de meras e até bizarras distrações. A alegria fraternal vem do Espírito Santo e só com ele se pode possuí-la com maior intensidade. Há hoje na psicologia religiosa uma análise que confirma que onde há pouca alegria entre consagrados há aí também pouca vida de oração.

Também não se fala de uma “alegria” que a comunidade “fabrica” com impulsos, motivações ou estímulos externos, vindas de um filme, de bebida alcoólica, piadas de sub-cultura ou afins. A alegria verdadeira vem de um interior pacificado, motivado, centrado, onde a confiança está firmada em Deus, onde o temor, pavor, medo ou qualquer insegurança não são mais componentes da vida da pessoa por ter se lançado fielmente e firmemente no projeto de Deus juntos com outros e outras a quem os/as têm como irmãos e irmãs.

Há um modelo de vida religiosa por demais europeizante que firma-se demais no fazer e numa certa sisudez, como se isso elevasse mais e melhor o espírito religioso. Em tal modelo a alegria não se sente em “casa”. Na cultura brasileira ou latino-americana a alegria é parte integrante da alma das pessoas. Lastimam-se quando jovens oriundos do meio popular e até mesmo com certa pureza no seu ser, ao chegar a determinados ambientes de formação ser “podados” na sua original espontaneidade em conta da sisudez secular da instituição acolhedora. Jesus é antítese da sisudez e de uma vida sem leveza e alegria no cotidiano, mesmo quando se “caminha para Jerusalém”;

Um casal em harmonia, confiança mútua, colaboração diária, tem espaço para muita alegria, mesmo quando aparecem as naturais intempéries da vida. Assim também na vida de membros que optam em viver a vida fraterna, sabem que a alegria é o rico bálsamo que traz uma saudável e importante “faxina” para a melhor atmosfera possível na vida da comunidade fraterna; O grande apóstolo já sabia quando dizia nas comunidades que fundou: “Alegrai-vos sempre no Senhor. Repito: ALEGRAI-VOS” (Filipenses 4,4).

Veja que a nossa alegria deve partir do Senhor e não de mecânicos estímulos que inventamos para tapar nossas solidões. Podemos estar enfermos, até mesmo com dor e ter a alegria verdadeira, fazendo até mesmo um chiste da dor. Como também podemos estar super saudáveis e sem alegria nenhuma. É uma questão de relação com o Senhor e com o nosso coração e o “coração” da comunidade fraterna; A alegria eleva a alma, desperta a criatividade, cura muitas doenças e neuroses e nos deixa mais joviais e com menos queixas e amarguras. A vida só é plenificada na alegria.

7º “C” = COMUNHÃO

“Mas, se andarmos na luz, como Ele na luz está, temos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus seu Filho nos purifica de todo pecado” - 1 João 1:7

Aqui está o ápice da vida fraterna: a comunhão de vida e de coração de uns com os outros. Comunhão essa que Jesus construiu com seu discipulado na dureza da vida na Palestina do seu tempo. A Igreja nasce de um grupo de pessoas tocadas pelo Espírito Santo e que os de fora vão dizer: eles têm um só coração e uma só alma! (Atos 2, 42-47); Sem comunhão é impossível existir de forma fecunda a Vida Consagrada. Deus é Comunidade de Amor na Trindade Santa e nos quer também como parte viva e dinamizadora dessa comunhão maior.

Mas comunhão exige que se passe de forma consciente e confiante pelos 6 “Cês” anteriores. Sem este processo nos tornamos como uma estátua bonita, bem enfeitada, mas morta e sem movimento. O movimento gerado por uma comunidade que vive em comunhão é algo que fascina e interessa o mundo doentio e vazio de sentido que aí está. As pessoas hoje têm sede de relações de comunhão e de amor profundos.

A comunhão é também uma forma de celebração permanente da vida, da fé, da esperança e da caridade. Quando há comunhão na vida fraterna tudo é de certa forma celebração. Sempre vai haver razões, alegrias e entusiasmo para celebrar a vida e a missão da comunidade fraterna, pois ela vive e atua em comunhão. Um aniversário será celebrado sem improvisação, pois estamos em comunhão com o irmão ou a irmã que celebrará logo mais a sua vida, que é também nossa/minha vida. Celebra-se com alegria a caminhada conjunta, a amizade, o trabalho, as vitórias e até mesmo as perdas e fracassos. Não celebrar com intensidade mostra a não intensidade da vida e da missão, porque está esvaziada de comunhão. Detalhes, coisas aparentemente insignificantes ganham sentido e plenitude onde passa a reinar a comunhão verdadeira. E na comunhão plena de mente (objetivos), de coração (amor) e de vida (caminho/compromisso) vive-se a felicidade testemunhada no salmo 133. Amém!

*Texto sem caráter científico/acadêmico e por isso mesmo sem notas bibliográficas ou afins. O que aqui foi ajuntado é fruto de anotações de um trabalho feito pelo autor num encontro de jovens religiosos. O autor, Pe. Cyzo Assis Lima,fpm, é fundador da FRATERNIDADE PALAVRA E MISSÃO – www.fraternidadesul.org.br - e presta assessoria na área de espiritualidade bíblica e formação para a Vida Consagrada missionária; e-mail: cyzoassis@gmail.com Este modesto texto, interessando, pode ser divulgado em qualquer meio, desde que citado a fonte onde está hospedado: www.unificante.blogspot.com http://unificante.blogspot.com/2011/04/vida-fraterna-comunitaria-modesta.html#more

Os 7 "Cês" MAIS NECESSÁRIOS DA VIDA FRATERNA

OS 7 “Cês” MAIS NECESSÁRIOS NA VIDA FRATERNA* A propósito de uma contínua reflexão sobre a dinâmica da vida fraterna comum e seus novos desafio; Cyzo Assis Lima,fpm A Vida Fraterna – VF - é uma graça de Deus acima de tudo. Muitas vezes perdemos esta consciência na nossa própria forma de viver e ser na comunidade de vida comum. Há poucos dias uma jovem muito entusiasmada e motivada para consagrar sua vida a Deus me disse de forma muito bonita: “Acho lindo como vejo o relacionamento entre vocês, os membros da Comunidade. Sinto que são de fato uma família, irmão e irmãs que se amam e se apóiam uns nos outros”. Essa jovem sem saber está falando de uma linda página do evangelho: “VÓS SOIS IRMÃOS” nos diz Jesus. (Mt 23,8). Apresento esta pequena e modesta reflexão quanto aos 7 Cs mais importantes/necessários na vida de irmãos e irmãs que se dispõem a caminhar juntos no serviço diário do Senhor do Reino e no Reino do Senhor. Naturalmente que a escrevo a partir do contexto de nossa vida e missão enquanto um carisma novo na Igreja e de vida fraterna mista. Talvez este texto seja melhor dirigido aos que estão no estágio formativo, especialmente no Noviciado ou Juniorado. “Vede: como é bom, como é agradável habitar todos juntos, como irmãos. É como o óleo fino sobre a cabeça, descendo pela barba, a barba de Aarão, descendo sobre a gola de suas vestes. É como o orvalho do Hermon, descendo sobre os montes de Sião; Porque aí manda Javé a bênção, a vida para sempre” - Salmo 133, 1-3 1º “C” = CORAGEM “Coragem! Ele te chama. Levanta-te!” - Marcos 10, 49-52 É preciso estar tomado pelo Espírito de Deus, pelo DOM da Coragem que vem direto do Espírito Santo para de fato consagrar a vida pessoal num caminho comunitário, com seus altos e baixos. A coragem aqui requer lucidez – dez luzes – e a pessoa não pode estar inserida numa espécie de “nuvem escura” onde caminha com insegurança, insatisfações e até mesmo medo. Sem a coragem que vem do mais profundo da pessoa, ela será sempre uma pessoa permanentemente insatisfeita dentro da vida fraterna. Não se joga prá valer para ser irmão ou irmã dos outros. Sempre vai ter uma espécie de “concessão ou negociação”, como se o ser irmão, na ótica do evangelho, fosse algo a ser negociado. O ser irmão ou irmã é um projeto de amor e o amor requer coragem. A Bíblia está cheia de experiências humanas de coragem e encorajamento de uns aos outros na construção fantástica do tornar-se irmão por causa do amor de Deus derramado nos corações. Continua sendo um testemunho que fala alto e também um mistério a vida fraterna numa cultura que lança milhões no individualismo e até mesmo no mais doentio egocentrismo. Sem uma boa dose de coragem evangélica jamais alguém tornará irmão ou irmã numa comunidade de vida fraterna. Há lindas experiências humanas na Igreja carregadas da mais fantástica beleza da fraternidade vivida numa autêntica irmandade/sororidade. Infelizmente também a Igreja torna-se espaço para vidas doentias, sofridas e que se tornam amargas, autoritárias, pesadas, por não serem vividas na dimensão evangélica do ser com os outros e para os outros. Sem ser irmão ou irmão na vida fraterna-comum, vive-se uma contínua tensão ou dualidade que leva à insatisfação contínua e infelicidade humana. Em marcos 10,49-52 Jesus está em plena construção do seu movimento discipular. Ele chama pessoas para integrarem a experiência do seguimento onde a partilha da vida, das esperanças e de tudo que daí deriva é fundamento primeiro. Entrar no movimento de Jesus é assumir a nova identidade do ser irmão dos que estão com Jesus. Esta dinâmica escapa aos “caprichos” humanos e torna-se 100% divina, pois é o Senhor que chama e organiza em torno de SI seus amigos e os levam a uma comunidade de irmãos em prol do Reino. 2º “C” = CONVERSÃO “Quem és tu Senhor?” E a resposta: “Eu sou Jesus, a quem tu estás perseguindo” Atos 9, 5 Só se torna verdadeiramente irmãos e irmãs quem interiormente deixou-se trabalhar pela Palavra de Deus, fazendo um sincero processo de conversão humana e espiritual. Sem conversão não se pode tornar-se irmãos e irmãs. Há muitas comunidades religiosas onde os membros são apenas “irmãos de mentirinha” e num plano apenas teórico. A práxis fraterna requer a capacidade de “carregar” uns aos outros nas alegrias e nas tristezas, nos fracassos e nas vitórias. Sem um coração e uma mente convertidos a um amor profundo e ilimitado, a uma relação amorosa com quem eu acolhi no meu coração como meu irmão ou minha irmã, vive-se apenas uma vida de contínuas tensões e perdas de energias, onde quase não reina a harmonia e a alegria fraternal. Em tal comunidade mais se tem velas “funerais” de choro que “fogos” de alegria e festa; Jesus lutou firmemente e decididamente para que seus discípulos aprendessem o difícil e fantástico caminho do ser irmão entre eles. Quando Ele diz: ”Vos sois irmãos”!, na verdade está dizendo: “agora vocês tem uma nova identidade”. Esta identidade nova torna vocês mais humanos, mais divinos e melhores pessoas e tem todos um mesmo Pai, um mesmo caminho e uma mesma paixão: O Reino de Deus. A conversão à alteridade precisa de certo tempo e de um processo onde muitos e importantes suportes devem ser levados em conta. Mas o principal está no coração de cada pessoa que de fato assume o aprendizado e a alegria do acolher em si o outro ou a outra como parte de si mesmo e dádiva que o Bom Deus, o querido ABBA, presenteia. Não há dinheiro suficiente que paga a beleza em poder abraçar-nos como verdadeiros irmãos e irmãs no Nome e na causa do Senhor. Conversão à Fraternidade é mais difícil que conversão à luta pela justiça ou a algo equivalente. A Fraternidade na mutualidade exige entrega total, transparência, ascese contínua e interminável. Conforme eu me adentro na relação mais profunda com os demais em torno de mim vou paralelamente adentrando a mim mesmo no meu eu mais profundo também. Às vezes não queremos descer em nossos “porões” e tememos ver por lá algo que uma vez “conhecido” precisará ser também “mostrado”. A quem mostrar? Certamente para aqueles que confiamos e com quem já construímos uma evangélica cumplicidade fraterna. Na caminhada para a vida fraterna autentica nos tornamos também mais evangelizados e por isso mesmo mais verdadeiros. 3º “C” = COMUNICAÇÃO “Eu e o Pai somos um!” João, 10,30 Na comunicação os seres humanos se completam e buscam juntos o sentido maior para a existência. Jesus foi comunicação viva com seus discípulos, com o povo que o seguia e especialmente com os pobres e sofredores com os quais Ele sempre buscava ter proximidade. Proximidade requer comunicação liberta, adulta, e tal comunicação leva à proximidade maior. Cria-se um ciclo fraterno-saudável. Na vida fraterna o diálogo maduro, respeitoso e fluente é fundamental para a boa qualidade da própria vida dos membros. Como irmãos e irmãs não podemos viver com um diálogo medíocre, pobre e com contínuas interrupções. Na vida de irmãos/ãs não deve reinar jamais um dia de silêncio enquanto mudez, fechamento ou mesmo empobrecimento do diálogo. Espíritos libertados têm na comunicação e no contato humano as duas asas para que se façam vôos mais altos e mais nobres. Acontece que a comunicação é uma arte que se aprende e não se adquiri por mérito pessoal. Nós humanos precisamos ser ajudados para que possamos falar no nosso inicial processo de apoderação da linguagem. Muito da comunicação na vida adulta tem a ver com o processo vivido onde os pais acertaram mais ou menos no ensino da linguagem e da comunicação baseada em valores e imagens portadoras de alegria, co-responsabilidade, educação e harmonização. Pessoas que se ferem facilmente e se fecham por quase nada tem um déficit não trabalhado na sua primeira infância quando aprenderam a falar. Há também um processo de “aprender a falar” no plano espiritual e da vida fraterna, mesmo quando se vai ficando adulto. A linguagem de irmãos e irmãs em Nome do Senhor deve ser baseada em conteúdos onde os valores do Reino de Deus estão sempre presentes. Uma sadia comunicação na comunidade de vida fraterna eleva os espíritos dos membros e torna possível a eles acertar mais em tudo o que fazem juntos. Jesus primou sobremaneira na comunicação com seu discipulado. Na verdade Ele era/é a verdadeira comunicação de Deus. Cristo usava imagens que elevava os espíritos dos mesmos e trazia a eles uma sabedoria natural. A comunicação é pobre quando gira mais em torno de sub-cultura ou em torno de temas que nada acrescentam à inteligência e à interioridade das pessoas. No período da formação sempre peço e insisto que os formandos e/ou formandas cuidem do conteúdo de suas falas. Falas com pobre ou infantilizado conteúdo não somam para uma comunicação madura e fecunda; Falas que sempre partem do negativo, da sub-cultura ou mesmo de fofocas intermináveis mostram que a comunicação não está fundamentada na Pessoa de Jesus e no seu evangelho, mas em deformidades do espírito e do caráter. Pessoas com tais deformidades podem ser curadas e devem ser ajudadas. Mas elas precisam esforçar-se mais do que pensam e caso não vençam tal comunicação baseada mais na “baixeza” que na elevação e na plenitude do humano e do Espírito, devem necessariamente deixar a vida fraterna, pelo simples fato de não poder dignificá-la e elevá-la humana e espiritualmente. O diálogo é uma relação em dois e na língua portuguesa esta palavra tem em si duas construções muito lindas: DIA – claridade, sol, visão, harmonia... – e LOGO – palavra, expressão viva e livre, conteúdo dito... ; 4º “C” = CORAÇÃO «A multidão dos que haviam abraçado a fé tinha um só coração e uma só alma” Atos 4, 32 Na comunidade de vida fraterna o centro é o coração. Coração como aquele órgão que irradia sangue, vida, que bate ininterruptamente garantido um ritmo de amorização permanente entre os membros. A vida fraterna pode muitas vezes está tão somente no plano da “cabeça”, do mero racional, formal, calculista, mecanizado e por isso mesmo com alto risco de neurotização. Às vezes a comunidade é bonitinha, arrumadinha, asséptica e até mesmo passa a imagem de uma “comunidade perfeita”. Mas por detrás disso tudo podem estar pessoas sofridas por pouca amorização e com um coração “dilatado”, sem força e sem capacidade de “enviar sangue” renovado a cada um dos seus membros. Uma comunidade fraterna “sem coração” deve até mesmo fazer Deus sofrer, quanto mais os seus próprios membros. Aqui se precisa muito do Espírito Santo, que é mestre em amorização para que a vida fraterna seja centrada num saudável coração capaz de amar e fazer-se amar. O coração da comunidade fraterna precisa do oxigênio da saudável “cumplicidade” entre os seus membros. Mexeu com um mexeu com todos. Um membro sofre, todos sofrem. Um membro alegra-se, todos se alegram. Um membro adoece, todos sentem. Um membro se cura, todos celebram; Há um centro vital na vida fraterna que se dá como o “coração” entre os membros que de fato se amam; Está associado ao coração também a dimensão da interioridade da espiritualidade. É também o coração – da comunidade e dos membros individualmente – o lugar de acolhida da Palavra de Deus, da Eucaristia e da caridade fraterna e das lutas solidárias. Uma comunidade assídua à oração, à escuta e à interioridade da Palavra de Deus e que cultiva a dimensão da partilha em vários níveis, será de fato lugar de bênção e de fecunda missão. Passa pelo coração uma séria e viva espiritualidade. Por isso que o coração está no centro da vida fraterna. Dele irradia-se luz e força para as outras dimensões da comunidade, da vida e da missão. Esforçamo-nos para que o nosso coração humano e o coração comunitário sejam mais parecidos com o grandioso coração de Jesus, cheio da beleza do mais puro amor destinado primeiramente aos seres humanos. 5º “C” = COMPROMISSO “Ainda que para outros eu não seja apóstolo, para vós, ao menos, o sou; pois o ‘SELO’ – compromisso – do meu apostolado sois vós, no Senhor” 1º Coríntios 9, 2 Quando numa comunidade fraterna não existe claramente a aliança de amor, o SELO = PACTO, compromisso, adesão mútua, co-responsabilidade, tem-se uma comunidade “manca das pernas” e que não chegará a lugar nenhum e se chegar chegará com um custo muito alto de muitos machucados. A relação das pessoas no mundo secular dá-se por áreas de interesse. A mentalidade sempre é: “Eu ajudo, mas quero ser ajudado”ou “eu dou algo, mas preciso ser recompensado”. Raramente se vê a mútua colaboração própria de irmãos e irmãs. Na vida fraterna a colaboração mútua é uma das principais colunas de sustentação da comunidade de vida. Pessoas que não sabem colaborar, servir, ajudar, amar, fazendo, e fazendo amando, não deveriam estar na Vida Consagrada. Em Jesus vemos o melhor exemplo de dádiva ilimitada aos seus irmãos e ao Pai. Podemos entender hoje colaboração mútua como “parceria na mesma causa e na mesma casa”; Somos parceiros, somos parte uns dos outros, em Nome do Senhor Jesus. Pela colaboração mútua se faz grandes milagres e se alcança lindas vitórias. A própria vida religiosa tem tantos e fantásticos exemplos neste sentido. Mas tem também muito de dor e sofrimento, quando pessoas, que chamamos de “malas sem alça” apenas são sugas-sugas da comunidade e não ativas colaboradoras da mesma. Na colaboração se dividirá os fardos uns dos outros, se aperfeiçoará tempo e espaço para o bem de todos e se faz uma comunidade mais leve e por isso mesmo mais autêntica. Quando pessoas não são capazes de assumirem um compromisso mútuo e com fraterna seriedade, não são aptas para a vida comunitária fraterna. Passam a ESTAR juntas sem SER juntas. É o SER IRMÃOS que interessa a Jesus no final de tudo. Há casos de pessoas na Vida Consagrada que fazem os votos “só para” Deus. Elas acham que Deus vai estar ao lado da cabeceira da cama quando caírem gravemente enfermas. Acham que Deus vai à justiça tomar a defesa delas quando por ventura caiam em alguma armação/tentação/injustiça. Acreditam que Deus vai lutar cada dia para que não falte a elas o pão, o remédio, a segurança pessoal e tantos outros cuidados. Deus fará tudo isso e muito mais através dos irmãos e irmãs, pois esta é a única forma que Ele tem para agir em prol dos que a Ele consagram suas vidas. Daí a importância da compreensão horizontal dos votos e não apenas a limitada visão verticalista dos mesmos. Consagramo-nos a Deus na Igreja. Igreja aqui é compreendida como a comunidade de irmãos e irmãs na mesma fé e reunida em torno da Pessoa do Senhor de nossas vidas: Jesus Cristo. Professamos cada vez: Ele está no meio de nós! Consagração “só a Deus” é anti-comunhão e vai ao desencontro de toda a significância evangélica dos Conselhos Evangélicos; Num campo de batalha os soldados fazem um pacto que nunca é rompido: caso alguns deles sejam atingidos e não morram, mas ficam gravemente feridos, sem puderem se locomover sozinhos, que possam contar que os companheiros os pegarão e levarão para fora da linha de fogo, salvando ainda suas vidas. Há inúmeros relatos de heroísmos de soldados que colocam sobre os ombros companheiros quase mortos e os carregam em meio ao fogo cruzado para deixá-los seguros. Há ali uma aliança verdadeiramente fraternal. Mais aliança deveria haver entre os que consagram suas vidas ao Senhor da Vida e que precisam cada dia também “carregar seus próprios irmãos” das mais diferentes formas. O amor que o soldado “salvador” tem pelos seus companheiros de luta é algo que deve tocar a vida de quem não precisa correr risco nenhum para amar/carregar seus próprios irmãos; Por fim, o “C” de compromisso é também o compromisso que a Comunidade Fraterna deve ter com o Reino de Deus – Lucas 4,14-22ª -. É difícil conceber uma comunidade de vida comum, onde seus membros se dizem irmanados entre si sem um compromisso visível, notório e prático com a dimensão da solidariedade, da missão evangelizadora e da justiça social. Caso torne-se uma comunidade de pessoas que se amam e se apóiam mas que teimam em manter-se fechada das lágrimas e gemidos da humanidade, tem-se certamente um clube e não uma comunidade evangélica. Irmão de verdade não me deixa na acomodação ou na omissão. Irmãos de verdade me levam a um compromisso reinocêntrico que farei também em nome deles. 6º “C” = CONTENTAMENTO “Alegrai-vos sempre no Senhor; outra vez digo, alegra-vos! Filipenses 4:4 Deve ser trágica uma vida em que a maior parte do tempo é feita sem contentamento = alegria. A falta da alegria leva a baixar nossas defesas e logo nos vemos doentes, melancólicos e até mesmo deprimidos; Aqui não se fala da alegria fugaz que o mundo dá. De uma alegria que gira em torno de meras e até bizarras distrações. A alegria fraternal vem do Espírito Santo e só com ele se pode possuí-la com maior intensidade. Há hoje na psicologia religiosa uma análise que confirma que onde há pouca alegria entre consagrados há aí também pouca vida de oração. Também não se fala de uma “alegria” que a comunidade “fabrica” com impulsos, motivações ou estímulos externos, vindas de um filme, de bebida alcoólica, piadas de sub-cultura ou afins. A alegria verdadeira vem de um interior pacificado, motivado, centrado, onde a confiança está firmada em Deus, onde o temor, pavor, medo ou qualquer insegurança não são mais componentes da vida da pessoa por ter se lançado fielmente e firmemente no projeto de Deus juntos com outros e outras a quem os/as têm como irmãos e irmãs. Há um modelo de vida religiosa por demais europeizante que firma-se demais no fazer e numa certa sisudez, como se isso elevasse mais e melhor o espírito religioso. Em tal modelo a alegria não se sente em “casa”. Na cultura brasileira ou latino-americana a alegria é parte integrante da alma das pessoas. Lastimam-se quando jovens oriundos do meio popular e até mesmo com certa pureza no seu ser, ao chegar a determinados ambientes de formação ser “podados” na sua original espontaneidade em conta da sisudez secular da instituição acolhedora. Jesus é antítese da sisudez e de uma vida sem leveza e alegria no cotidiano, mesmo quando se “caminha para Jerusalém”; Um casal em harmonia, confiança mútua, colaboração diária, tem espaço para muita alegria, mesmo quando aparecem as naturais intempéries da vida. Assim também na vida de membros que optam em viver a vida fraterna, sabem que a alegria é o rico bálsamo que traz uma saudável e importante “faxina” para a melhor atmosfera possível na vida da comunidade fraterna; O grande apóstolo já sabia quando dizia nas comunidades que fundou: “Alegrai-vos sempre no Senhor. Repito: ALEGRAI-VOS” (Filipenses 4,4). Veja que a nossa alegria deve partir do Senhor e não de mecânicos estímulos que inventamos para tapar nossas solidões. Podemos estar enfermos, até mesmo com dor e ter a alegria verdadeira, fazendo até mesmo um chiste da dor. Como também podemos estar super saudáveis e sem alegria nenhuma. É uma questão de relação com o Senhor e com o nosso coração e o “coração” da comunidade fraterna; A alegria eleva a alma, desperta a criatividade, cura muitas doenças e neuroses e nos deixa mais joviais e com menos queixas e amarguras. A vida só é plenificada na alegria. 7º “C” = COMUNHÃO “Mas, se andarmos na luz, como Ele na luz está, temos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus seu Filho nos purifica de todo pecado” - 1 João 1:7 Aqui está o ápice da vida fraterna: a comunhão de vida e de coração de uns com os outros. Comunhão essa que Jesus construiu com seu discipulado na dureza da vida na Palestina do seu tempo. A Igreja nasce de um grupo de pessoas tocadas pelo Espírito Santo e que os de fora vão dizer: eles têm um só coração e uma só alma! (Atos 2, 42-47); Sem comunhão é impossível existir de forma fecunda a Vida Consagrada. Deus é Comunidade de Amor na Trindade Santa e nos quer também como parte viva e dinamizadora dessa comunhão maior. Mas comunhão exige que se passe de forma consciente e confiante pelos 6 “Cês” anteriores. Sem este processo nos tornamos como uma estátua bonita, bem enfeitada, mas morta e sem movimento. O movimento gerado por uma comunidade que vive em comunhão é algo que fascina e interessa o mundo doentio e vazio de sentido que aí está. As pessoas hoje têm sede de relações de comunhão e de amor profundos. A comunhão é também uma forma de celebração permanente da vida, da fé, da esperança e da caridade. Quando há comunhão na vida fraterna tudo é de certa forma celebração. Sempre vai haver razões, alegrias e entusiasmo para celebrar a vida e a missão da comunidade fraterna, pois ela vive e atua em comunhão. Um aniversário será celebrado sem improvisação, pois estamos em comunhão com o irmão ou a irmã que celebrará logo mais a sua vida, que é também nossa/minha vida. Celebra-se com alegria a caminhada conjunta, a amizade, o trabalho, as vitórias e até mesmo as perdas e fracassos. Não celebrar com intensidade mostra a não intensidade da vida e da missão, porque está esvaziada de comunhão. Detalhes, coisas aparentemente insignificantes ganham sentido e plenitude onde passa a reinar a comunhão verdadeira. E na comunhão plena de mente (objetivos), de coração (amor) e de vida (caminho/compromisso) vive-se a felicidade testemunhada no salmo 133. Amém! *Texto sem caráter científico/acadêmico e por isso mesmo sem notas bibliográficas ou afins. O que aqui foi ajuntado é fruto de anotações de um trabalho feito pelo autor num encontro de jovens religiosos. O autor, Pe. Cyzo Assis Lima,fpm, é fundador da FRATERNIDADE PALAVRA E MISSÃO – www.fraternidadesul.org.br - e presta assessoria na área de espiritualidade bíblica e formação para a Vida Consagrada missionária; e-mail: cyzoassis@gmail.com Este modesto texto, interessando, pode ser divulgado em qualquer meio, desde que citado a fonte onde está hospedado: www.unificante.blogspot.com http://unificante.blogspot.com/2011/04/vida-fraterna-comunitaria-modesta.html#more

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Pastoral da Aids e Casa Fonte Colombo em Capacitação


Agentes da Pastoral da Aids de diversas cidades do Rio Grande do Sul e voluntários da Casa Fonte Colombo estiveram reunidos de 08 a 10 de abril na Casa de Encontros Vila Betânia em Porto Alegre. A equipe de coordenação lembrou aos participantes que o encontro pretende ser um espaço de aquisição e partilha de conhecimentos em HIV e AIDS para melhor respondermos aos desafios advindos dessa realidade.

O conteúdo foi divido em 4 blocos: dados técnicos ( o que é HIV e AIDS), Pastoral da AIDS (mística, espiritualidade, perfil do agente), incidência política (participação em espaços de controle social a fim de se controlar a epidemia e garantir os direitos das pessoas vivendo com HIV e AIDS) e Programa de Incentivo ao Diagnóstico Precoce ( incentivo para a realização do teste da AIDS).

Estiveram presentes representantes das dioceses de Caxias, Santa Cruz, Cruz Alta, Pelotas, Novo Hamburgo, Osório, do Vicariato de Gravataí e do Vicariato de Porto Alegre. O grupo demonstrou interesse para com a temática e mostrou-se disposto a multiplicar os conhecimentos adquiridos.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

QUEM CRÊ VIVE PLENAMENTE E CUIDA DA BIODIVERDIDADE


Hoje somos convidados/as a avançar na descoberta do mistério de Deus e do Ser Humano que se escondem e revelam em Jesus de Nazaré. Fazemos com uma serena e responsável consciência das nossas fragilidades, possibilidades e esperanças. Sabemos que a vida é como a flor do campo, tão bela quanto vulnerável. Desejamos ardentemente e escolhemos resolutamente a Vida para nós mesmos/as e para todas as criaturas, mas sabemos das ameaças às quais ela é submetida. Dietrich Bonhoefer, teólogo, pastor e mistico protestante, não quis se fingir de cego diante da violência mortal do nazismo e, em nome de sua fé, engajou-se no combate contra esta doença cultural e política. Seu jovem corpo, pendurado na forca em Flossenburg (+ 09.04.1945), continua denunciando as cegueiras do mundo e testemunhando a clarividência à qual todos/as somos chamados/as.

“Senhor, já cheira mal...”

Não é mais nova a notícia de que nosso planeta corre riscos. “O caminho tende à catástrofe planetária e podemos ir ao encontro do destino dos dinossauros” (CF 2011, n° 94). Vem de longe a denúncia de que o homem se tornou lobo do homem. E ressoa há muito tempo o grito que pede um basta ao violento processo de exclusão que se abate sobre a imensa maioria da humanidade. Este mundo de Deus se tornou um vale de lágrimas, adquiriu contornos de sepultura coletiva e está cheirando mal. As metáforas são fortes, mas não exageradas. Não podemos cair no pessimismo doentio daqueles que vêm em tudo as marcas do pecado, mas não há como ser ingênuo e se deixar seduzir pelo canto das sereias do neoliberalismo predatório. E a fuga numa piedade intimista, com suas crises e vazios de sentido, tem conotações de cegueira, indiferença e medo. E o que dizer da adesão ao fantasioso mundo da moralidade e de uma mal dita transcendência, onde o único probela é o pecado e a culpa?

“Vou tirar vocês de seus túmulos...

Este é o irrenunciável ponto de partida, mas não o aspecto essencial da nossa fé. O coração dinâmico do cristianismo é a promessa – que em Jesus de Nazaré se torna prova e antecipação – de que Deus faz novas todas as coisas, de que ele muda deserto em jardim, rocha em fonte, caixão em berço, morte em vida, ruínas em cidade habitada, exilados em cidadãos. O movimento que nasce do Evangelho é promotor da vida, e cumpre esta missão abrindo horizontes e não chamando ao passado. Aos judeus que há décadas provavam o amargo sabor do exílio na Babilônia, haviam perdido toda esperança e comparavam sua condição à de um monte de ossos secos, Deus manda dizer: “Vou tirar vocês desta sepultura, dar-lhes meu espírito e levá-los de volta à própria terra...” É neste caminho de saída e retorno à autonomia como povo que eles ficarão sabendo de fato quem é Deus. E Jesus afirma que a adesão à sua pessoa e ao seu projeto abre uma nova era para a humanidade oprimida.

“Se tivesses estado aqui, meu irmão não teria morrido...”

A sensação de fracasso e frustração, conhecida de todos nós, se faz refrão acusatório na voz de Marta e de Maria. A impressão é de que Jesus tenha feito pouco caso quando lhe avisaram: “Aquele que amas está doente”. Muitas vezes temos esta mesma sensação diante de doenças incuráveis, de acidentes trágicos, de mortes estúpidas, de catástrofes naturais. Na revolta gerada no ventre dor, alguns/as chegam a acusar Deus de ausente, desinteressado, cínico e sem coração. Mas sabemos que “Jesus amava Marta, a irmã dela e Lázaro”, assim como ele ama apaixonadamente cada uma das grandes ou pequenas criaturas do seu e nosso pai. Este é seu mundo e aqui é sua morada. Nós somos sua família, seus irmãos e irmãs, seus amigos e amigas, mesmo que ele não se deixe prender aos nossos desejos e interesses – nem sempre suficientemente abertos – nem se submeta às urgências do nosso calendário. Em Jesus nos descobrimos uma grande família, que inclui todas as criaturas.

“Se creres, verás a glória de Deus...”

Cedo ou tarde, Jesus chega para nos ajudar a mudar as coisas. Em Betância, ele encontra suas amigas em pranto, tristes tanto pela perda do irmão como pela ausência injustificável de Jesus. Mas Jesus não é prepotente nem indiferente: ele participa da humana dor das amigas, como faz também hoje diante de todos aqueles/as que choram, impotentes e inconsoláveis. “E Jesus começou a chorar...” É mediante a compaixão e a transformação que ele nos faz experimentar seu amor. “Vejam como ele o amava...” Eis aqui a porta que abre a possibilidade de mudança: o amor e a compaixão, tão divinos e tão humanos. Não se trata de apostar ou acreditar no poder de Deus, mas na força do seu amor. Da parte de Jesus de Nazaré, o amor que se compadece; da nossa parte, a confiança que abre horizontes e possibilidades. Da fé e da abertura ao amor brotam novas possibilidades de Vida e ressurreição. A fé é esta abertura radical para transcender o óbvio, o esperado, o devido. “Se você acreditar, verá a glória de Deus”. O que Jesus diz com esta afirmação? Pensamos geralmente que ele quer dizer que a fé nos ajuda a provar o poder de Deus agindo em nosso favor. Mas o que Marta e Maria presenciam é algo diferente: é a profunda e humana identificação de Jesus com suas dores. Esta é a glória de Deus: seu amor pela humanidade. A glória de Deus é o ser humano vivo, dizia Santo Irineu. A glória de deus brilha na beleza, na diversidade e na comunidade das suas criaturas.

“Lázaro, vem para fora!”

Jesus convida Maria a ultrapassar a dor que tende a obscurecer o olhar da fé. E Lázaro, no escuro da morte e no fundo da sepultura, também é interpelado: “Vem para fora!” O grito de Jesus, pronunciado no contexto de sua oração, nos chama à vida, a um olhar e um novo agir. É apelo a sair dos nossos interesses e projetos, geralmente nascidos no ventre do medo e da indiferença. É um convite a sair da prisão dos sistemas de poder e de morte e emprender um caminho, a fazer a passagem-páscoa. Mas nesta saída e em todo caminho nossos passos serão sempre necessariamente inseguros. Pertencemos à história e temos muitas amarras. Mas escutamos, de formas diversas, uma ordem: “Desamarrem e deixem que ele ande...” A fé em Jesus Cristo não é doutrina que fecha, peso que oprime, laço que amarra. Oxalá toda a Igreja aprenda esta lição! Como diz Paulo, crer é deixar-se conduzir pelo Espírito de Deus, que ressuscitou Jesus e dá vida ao nosso corpo marcado de morte. Este mesmo Espírito conduz toda a criação à sua própria plenitude, santificando tanto o gênero humano como a história e o universo como um todo. “O Espírito opera a obra da reconciliação no âmbito de toda a criação, agindo misteriosamente no interior de cada ser humano para que este, aos poucos, se configure a Cristo, o Primogênito da criação” (CF 2011, n° 170). Ele congrega as pessos isoladas de moso que sejam corpo de Cristo, e faz deste corpo a mediação de sua ação vivificadora no mundo.

“Muitos judeus viram o que Jesus fizera e creram nele.”

Marta e Maria acreditaram e por isso viram a glória de Deus manifestada na compaixão que resgata a vida. E muitos judeus que “viram o que Jesus fez, acreditaram nele”. Mas o que é que eles realmente viram? Contemplaram e testemunharam a profunda humanidade de Deus e este incrível dinamismo que o aproxima das suas criaturas machucadas e oprimidas, sem se importar se cheiram mal. Viram isso na relação de Jesus com Lázaro, com Maria e com Marta, e por isso acreditaram! Crer é deixar os estreitos limites dos nossos medos e interesses e aderir a Jesus Cristo e à sua ação promotora de vida. É claro que os primeiros beneficiados somos nós mesmos, mas este é apenas uma das consequências do ato de crer. A fé nos leva a reconhecer que “cada vida é sagrada porque a criação é de Deus e a bondade de Deus a permeia completamente”, e a “assumir o compromisso de ser membro da comunidade vivente da criação, colaborando com o projeto divino para que se realize e consolide a sua vontade em todas as criaturas” (CF 2011, n° 153-154). Voltemo-nos a Deus inspirados na oração que Bonhoefer elevou a Deus na prisão. Senhor, as trevas nos envolvem, mas em ti há luz. Sentimo-nos sozinhos, mas tu não nos abandonas. Sentimo-nos desfalecer, mas em ti encontramos socorro. Provamos a inquietação, mas em ti encontramos a paz. A amargura nos devora, mas em ti encontramos a paciência. Não compreendemos teus caminhos, mas tu sabes qual é a boa estrada para nós. Acolhe-nos como membros vivos do teu corpo e assim te ajudaremos a chamar para fora, a resgatar os homens e mulheres das sepulturas que os aprisionam. Assim seja! Pe. Itacir Brassiani msf

sexta-feira, 1 de abril de 2011

CONTEMPLAR A VIDA COMO POETA E AGIR COMO PROFETA

O caminho espiritual da quaresma e as imagens que nos convidam a saboreá-lo em sua profundidade são magníficos: jejum, deserto e tentações; nuvem, medo, transfiguração, escuta; sede, encontro, água, fonte; trevas, cura, luz.... Como crianças que se deixam educar na fé, vamos pouco a pouco redescobrindo Jesus como pão da vida, como filho amado, como água viva, como luz do mundo. Jesus Cristo se apresenta hoje como luz que faz resplandecer a verdade e a beleza de todas as coisas. Ele nos lembra nosso parentesco com o pó e com o barro da terra e, assim, abre nossos olhos para que acreditemos nele, olhemos o mundo na sua perspectiva e nos engajemos na sua obra de preservar e promover a biodiversidade e a vida plena das suas criaturas.


“Não tomeis parte na obra estéril das trevas...”

Vivemos no século XXI, orgulhosos de nossa modernidade iluminada. O conhecimento emancipado expulsa o mistério para fora da arena do saber. Refletores potentes como a utilidade, a funcionalidade, a novidade, a neutralidade, a laicidade e a cientificidade parecem jogar luz sobre o mistério da vida e da morte. Pensamos ter deixado para trás a minoridade tutelada pela religião, resquício do obscurantismo medieval, e alcançado a maioridade iluminada, indiferente a tudo e livre de qualquer responsabilidade. Na confusa passagem da organização tribal a uma monarquia embrionária, Jessé se orienta pelos esquemas culturais e sociais que dão destaque à aparência física e à posição na hierarquia. Quando reúne os filhos para apresentá-los como candidatos ao trono de Isarel, nem se lembra do filho caçula, mais afeito aos pastos que às escaramuças das armas. Como sempre, na mesa de festa e nos cumes do poder, não há lugar para os últimos. Isso não são trevas? Um judeu nasce cego e pobre e deve mendigar para sobreviver. Ao mal fisico da cegueira se acrescenta a chaga social da pobreza. E o que dizer do mal espiritual de quem pensa que o mendigo cego e sua família são os únicos culpados por tudo isso? Parece que os próprios discípulos pensavam assim. E ai de quem ousa mudar esta condição natural e atuar contra os costumes e leis naturais que cimentam esta ordem social! “Este homem não pode vir de Deus... Nós sabemos que este homem é um pecador...”

“Não te impressiones com a sua aparência, com a sua grande estatura...” Não precisamos fazer um grande esforço ou escrever muitas linhas para lembrar que em pleno mundo das luzes existem grandes contingentes humanos que vivem no escuro sub-mundo e têm negado o acesso à mesa dos bens por eles mesmos produzidos. E não faltam aqueles/as que, voltando as costas, fazem de conta que não estão vendo nada, ou, com o dedo em riste, os acusam como únicos responsáveis pelas próprias desgraças. Que o sábio Samuel venha em nossa ajuda. Ele nos ensina que é preciso superar este velho e terrível modo de ver o mundo, esta visão que mede as coisas e pessoas segundo a força física, as aparências ou o lugar que ocupam na hierarquia. Diante dos filhos de Jessé, hierarquicamente ordenados para receber a unção do poder, Samuel ouve a voz que vinha das profundezas da sua humana condição: “Não se impressione com a aparência deles... O ser humano olha as aparências, mas Deus olha o coração...” Despertado por esta voz que expressa um dos mais belos arquétipos da humanidade, Samuel abre os olhos e se recusa a participar daquilo que Paulo chama de “ação estéril das trevas”. Ele se dá conta de que havia um lugar vazio na mesa preparada para a festa. “Falta o menor... Não nos sentaremos à mesa enquanto ele não chegar...” O olhar de Deus é outro e seus caminhos são alternativos. E o seu Espírito repousa e age sobre o insignificante Davi, o menor, o esquecido e excluído.

“Eu vim a este mundo para provocar um julgamento...” Este olhar outro e alternativo, diverso e inverso próprio de Deus e daqueles/as que nele acreditam se mostra de forma mais clara ainda em Jesus de Nazaré. Para ele, nem o cego mendigo nem sua pobre família são culpados de qualquer coisa. Jesus não explica as causas de sua cegueira, mas chama todos a tomar uma posição. “Temos que realizar as obras daquele que me enviou...” Estamos diante de uma pessoa necessitada que pede uma ação solidária, e não diante de alguém que precisa ser julgado. Sendo quem é e agindo como age, Jesus se mostra luz que ajuda a discernir e compreender a realidade assim como ela é, boa ou má. “Enquanto estou no mundo, eu sou a luz do mundo...” Trata-se de ver a ausência dos últimos e chamá-los a ocupar os primeiros lugares, de recuperar a visão daqueles/as que não conseguem ver e de devolver-lhes a cidadania. E este discernimento não se resume a um ato puramente intelectual, mas tem seu arremate numa ação que recria a realidade. Samuel agiu descartando os orgulhosos e destacando o humilhado. Jesus cura o cego, justifica sua família e afirma a culpa da elite religiosa. Ele age recorrendo aos recursos da terra e devolve a visão, a maioridade e dingidade àquele homem dependente. Agindo desse modo, Jesus questiona a ordem estabelecida e aqueles/as que a sustentam. As ideologias iluministas e as elites iluminadas se comprazem em culpar as vítimas e inocentar os algozes, mas Jesus desmascara estas mentiras cínicas.

“Porventura também nós somos cegos?” É preciso ver o mundo com os olhos dos poetas e agir com a coragem dos profetas. Exercitar um olhar capaz de transcender as aparências e agir de modo a derrubar os muros construídos pela exclusão e mantidos pelo medo ou pela indiferença. Vencer o medo acomodador que nos leva a duvidar que existem pessoas e grupos excluídos. “Não acreditaram que ele tinha sido cego...” Exercitar este discernimento é uma missão urgente e permanente, extensiva a todo discípulo e discípula de Jesus Cristo. É possível que as pessoas que pensam saber tudo e exaustivamente se revelem cegas e incapazes de ver as coisas em sua profundidade, nas suas verdadeiras dimensões. É evidente que esta cegueira não se restringe a alguns sistemas filosóficos que se apresentam como iluministas. Toda ideologia, instituição ou sistema fechado em si mesmo, com pretensões de totalidade, sejam eles partidos, nações, instituições, Igrejas ou academias tem vocação totalitária e, portanto, cai na tentação das práticas de exclusão. Esta é a advertência que nos faz a CNBB: a cultura e as ideologias de dominação muitas vezes pervadem as ciências e os meios de comunicação, os quais apresentam meras hipóteses como se fossem dados consolidados, idolatrizam o conhecimento técnico e fazem promessas fantasiosas. “Por trás desta venda de ilusões não se esconderiam até segundas intenções de caráter mais político-ideologico, no sentido de distrair as atenções do povo das verdadeiras causas do seu sofrimentos imediatos...?” (CF 2011, n° 113).

“Procedei como filhos da luz...” Paulo pede que nos comportemos como filhos da luz, e isso significa: ser bom com todos, lutar pela justiça, reestabelecer a verdade. Mas o ponto de partida é a auto-crítica: “Será que também somos cegos?” Trata-se de despertar da tranquilidade do nosso sono, como pede Paulo. E os passos seguintes levam a perseverar no caminho de Jesus de Nazaré, a pedir que ele abra nossos olhos, a assumir seu ponto de vista, a colaborar com sua ação libertadora. É isso que Martin Luther King procurou fazer, fiel ao Evangelho e soldário com seus irmãos negros, pagando esta ousadia com o martírio (+ 04.04.1968). Mas este é um caminho cercado de ameaças e incompreensões. Aquele homem cego e mendigo que recuperou a capacidade de ver e discutir com as auoridades encurraladas enfrentou sentenças ferozes: “Você nasceu inteirinho no pecado e quer nos ensinar?” E o próprio Jesus, por ousar retirar o véu dos olhos do ceho e levantar o manto da exclusão que o vitimava, não tardou a ser carimbado como pecador. Não é novidade que também os terapeutas sociais de hoje sejam demonizados e execrados pela mídia. Jesus, homem e profeta de Nazaré, tu nos ensinas que nunca termina de começar este caminho de abrir nossos olhos e ver as coisas na tua perspectiva. Abre nossos olhos, para que reconheçamos que tu és a Luz do mundo e vejamos a impotência e a dependência à qual são submetidos tantos irmãos e irmãs. Guia-nos a uma vida realmente sábia, caracterizada pela sabedoria que vê e acolhe a verdade, seja a de uma mulher da Samaria ou a de um mendigo anônimo. Ajuda-nos a encontrar no barro da terra a familiaridade que nos une a todas as tuas criaturas e restitui a vida tanto aos seres humanos como ao mundo animal, vegetal e mineral. E que os clamores sejam sempre de vitória e as dores sejam sempre de parto. Assim seja! Pe. Itacir Brassiani msf