sexta-feira, 30 de abril de 2010

José, um Operário

A festa de são José Operário fui instituída pelo Papa Pio XII, em 1955, com a intenção de reafirmar a dignidade dos trabalhadores e trabalhadoras e, ao mesmo tempo, dar uma marca católica à celebração civil e classista do dia 1° de maio. O próprio Pio XII havia dito, por ocasião do Natal de 1942: “Todo trabalho possui uma dignidade inalienável e, ao mesmo tempo, uma íntima ligação com a pessoa em seu aperfeiçoamento: nobre dignidade e prerrogativa que não são de modo algum aviltadas pela fadiga e pelo peso que devem ser suportados como efeito do pecado original em obediência e submissão à vontade de Deus.”
Antes dele, Leão XIII havia escrito “Os porletários e operários têm como direito especial o de recorrer a são José e de procurar imitá-lo. José, de fato de família real, unido em matrimônio com a mais santa e a maior entre todos as mulheres, considerado como o pai do Filho de Deus, não obstante tudo passou a vida toda a trabalhar e tirar do seu trabalho de artesão tudo o que era necessário ao sustento da família.” E introduzindo o nome de São José no cânon da missa, o Papa João XXIII quis homenageá-lo como exemplo de vida cristã, homem trabalhador e honesto, fiel e obediente à palavra de Deus.
O pai de Jesus era um carpinteiro
Em geral essa afirmação não causa hoje nenhum problema para os cristãos, se bem que muitos parecem lamentar secretamente que Jesus não tenha sido descendente da família nobre ou da dinastia sacerdotal... Mas no contexto das primeiras comunidades cristãs, especialmente no ambiente do judaísmo e do império romano, a origem social de Jesus atraía suspeita e desprezo sobre seu ensino e suas ações.
Ouvindo o ensino de Jesus na sinagoga, seus conterrâneos se perguntavam perplexos: “De onde vem essa sabedoria e esses milagres? Esse homem não é o filho do carpinteiro?” Nomeando de cor os membros de sua humilde família, não conseguiam entender e ficaram escandalizados (cf. Mt 13,53-58). A condição de vida de José e a profissão que exercia eram causa de menosprezo e dificultavam a aceitação da mensagem de Jesus por parte do seu próprio povo.
Mas este é um dado que não podemos esquecer ou diminuir: José é um homem que viveu do próprio trabalho. No século XIX, o Pe. Berthier, fundador dos Missionários da Sagrada Família, escrevia: “José era um pobre artesão: ele não recebeu outra herança senão as mãos, outro capital senão a carpintaria, outros recursos senão o próprio trabalho” (Le prêtre II, p. 802). E esse trabalho foi o caminho que o levou à integridade nas suas relações com Maria, com Jesus, com seu povo e com Deus.
Um trabalhador pode alcançar a sabedoria?
A expressão grega tektôn, que normalmente é traduzida por carpinteiro, expressa também o ofício do pedreiro e do ferreiro. De qualquer maneira, sempre trabalhos artesanais. Assim, podemos supor com bastante fundamento histórico e literário que José e Jesus foram artesãos experimentados no ofício da carpintaria e muito conhecidos nas vilas da região.
Podemos presumir também que, seguindo o costume segundo o qual o pai devia ensinar sua profissão aos filhos, José ensinou Jesus a distinguir os diversos tipos de madeira e suas qualidades específicas: plátano, terebinto, cipreste, sicômoro, acácia, oliveira, zimbro, pinheiro, etc. Ensinou-o também a usar adequadamente as ferramentas de trabalho: machado, martelo, serra, plaina, cinzel, etc. E observando o jeito de José trabalhar, Jesus aprendeu o valor de um trabalho bem feito.
O livro do Eclesiástico registra uma certa reserva e até menosprezo frente aos trabalhadores manuais. “Aquele que está livre de atividades torna-se sábio. Como poderá tornar-se sábio aquele que maneja o arado e cuja glória consiste em manejar o ferrão? Como pode tornar-se sábio aquele que guia bois, não abandona o trabalho e só sabe falar de crias de vacas?... O mesmo acontece com todo carpinteiro e construtor, e com qualquer pessoa que trabalha dia e noite...” (Eclo 38,24-27).
Com base nisso, podemos concluir que, como os demais trabalhadores manuais, José e Jesus “não são requisitados no conselho do povo, não têm lugar especial na assembléia, não se assentam na cadeira do juiz, nem conhecem as disposições legais. Eles não brilham pela cultura nem pelo julgamento, e não entendem de provérbios. Entretanto, são eles que sustentam as necessidades básicas, e a oração deles consiste em realizar o próprio trabalho” (Eclo 38,34).
A dignidade dos trabalhadores
A festa de São José Operário tem como objetivo celebrar o valor do trabalho humano e proclamar a dignidade dos trabalhadores e trabalhadoras. São José nos ajuda a voltar nosso olhar àqueles e aquelas que hoje necessitam do próprio trabalho para sobreviver e, ao mesmo tempo, realizam através dele sua vocação de construir o bem comum.
Nossa fé sublinha que Deus assumiu a condição humana, inclusive a de trabalhador. “Pela sua encarnação, o Filho de Deus, de certo modo, uniu-se a todos os seres humanos. Trabalhou com mãos humanas, pensou e agiu como qualquer ser humano, amando com um coração humano. Nascido da Virgem Maria, foi realmente um dos nossos em tudo, exceto no pecado” (Gaudium et Spes 22).
O mesmo documento conciliar recomenda engajamento e alegria aos cristãos que “seguindo o exemplo de Cristo, que trabalhou como operário, exercem todas as suas atividades unificando os esforços humanos, domésticos, profissionais, científicos e técnicos numa síntese vital com os bens religiosos, sob cuja direção tudo se orienta para a glória de Deus” (Gaudium et Spes 43). Assumindo trabalhos manuais humildes em Nazaré, Jesus conferiu uma dignidade especial ao trabalho e aos trabalhadores/as (cf. Gaudium et Spes 67).
Mudar os sistemas iníquos
Em tempos de crise estrutural como esta que estamos atravessando, as saídas apresentadas como mais razoáveis e urgentes normalmente trazem prejuízos aos trabalhadores. Fala-se sempre em flexibilizar os direitos trabalhistas, mas pouco se fala em flexibilizar os índices de lucro dos empresários e banqueiros. A Igreja afirma sem rodeios que “é iníquo e desumano” organizar a produção “em detrimento dos trabalhadores”. “Nenhuma lei econômica o justifica” e, nesses casos, “a greve deve ser reconhecida como um direito de defesa dos trabalhadores” (Gaudium et Spes 68).
Muitos ainda preferem imaginar José trazendo nas mãos lírio da pureza e não as ferramentas de trabalho. E gostam de contemplar Jesus trazendo trazendo na cabeça uma coroa real e nas mãos o pergaminho ou o cajado, a patena e o cálice, mas jamais uma foice ou uma enxada! E o mundo viria abaixo se alguém ousasse representar José e Jesus numa manifestação pela redução da jornada de trabalho, contra a flexibilização das leis trabalhistas ou por uma nova ordem internacional...
Que o trabalho não seja em vão
Paulo Coelho confessou que gosta de imaginar Jesus celebrando sua última ceia numa mesa fabricada na marcenaria de José. Mesmo que isso não seja historicamente provável, é importante sublinhar os laços que unem José e Jesus, sejam eles de trabalho ou de missão. Jesus será sempre o filho e o herdeiro do carpinteiro de Nazaré, e dele aprendeu a relevância da utopia religiosa, o valor do trabalho e a dignidade dos trabalhadores e trabalhadoras.
De minha parte, concedo-me o direito de imaginar José e Jesus envolvidos no trabalho em mutirão para construção de casas no povoado de Nazaré. À noite, em casa, depois da modesta janta, vejo José puxa de memória o Salmo 127: “Se Javé não constrói a casa, em vão labutam os construtores. Se Javé não guarda a cidade, em vão vigiam os guardas. É inútil que vocês madruguem e se atrasem para deitar, para comer o pão com duros trabalhos: aos seus amigos ele o dá enquanto dormem.”
Interrompendo a prece, fixa demoradamente seu olhar terno no rosto de Jesus, e depois continua: “A herança que Javé concede são os filhos, seu salário é o fruto do ventre: os filhos da juventude são flechas na mão do guerreiro.” E Maria, envolvendo José com um abraço carinhoso, completa: “Feliz o homem que enche sua aljava com elas; não será derrotado na porta da cidade quando litigar com seus inimigos.” Ela sabia que seu marido não brilhava pela cultura e não entendia de provérbios, mas das suas mãos vinha boa parte do sustento da família, e seu trabalho subia ao céu como oração.
Pe. Itacir Brassiani msf

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Protesto contra a Falta de medicação para Pessoas com HIV/Aids

ONG’s integrantes do Fórum ONG Aids do RS como a Casa Fonte Colombo e a Pastoral da Aids, representantes da Rede Católica frente ao HIV e Aids - América Latina e o Caribe e portadores de HIV e Aids, protestaram ontem contra a falta de medicamentos em Porto Alegre.







terça-feira, 27 de abril de 2010

Vida Fraterna

Nós, da Fraternidade Fonte Colombo, neste final de semana – 24 e 25/04/10, tivemos a oportunidade de vivenciar mais um momento fraterno com a Visita dos nossos confrades João Carlos Romanini, Luciano Lambert e Gilmar Zampieri. Na oportunidade, tivemos a alegria de assistir ao GreNal e saborear um delicioso jantar: risoto de frutos do mar prepara pelas mãos de Frei Lucino. Realmente estes momentos são eternos para a nossa vida.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

A Pratica de Exercícios fisícos para HIV/Aids na Casa Fonte Colombo

Sabemos que praticar exercícios físicos é bom para qualquer pessoa. Os exercícios são importantes para fortalece o corpo , melhorar a circulação sanguínea e fazer com que todos os órgão funcionem melhor. Para quem tem HIV ou Aids os benefícios dos exercícios são: O combate à lipodistrofia um dos efeitos colaterais da medicação; a Melhora nos padrões de sono: O “relógio Biológico”se torna mais regulado; O fortalecimento do sistema imunológico: já é cientificamente comprovado que os exercícios físicos também aumentam o numero de linfócitos T ou CD4, o que permite ao sistema imunológico responder melhor as doenças oportunistas que acometem os soropositivos. Nesta perspectiva vamos iniciar , no grupo de convivência da casa fonte Colombo, exercícios simples de aquecimento, respiração e alongamento para incentivar os usuários a fazer ao menos 10 a 15 minutos por dia de exercícios e caminhadas.
Frei Eduardo










quinta-feira, 22 de abril de 2010

O Alegre Testemunho de doação e serviço

O alegre testemunho de doação e serviço desperta vocações.
(At 13,14.43-52; Sl 99/100; ap 7,9.14-17; Jo 10,27-30)
O quarto domingo do tempo pascal nos apresenta Jesus como Cordeiro-Pastor que revela e anuncia o Pai mais mediante o testemunho das ações que de palavras. Neste dia dedicado à oração pelas vocações, o Papa nos lembra que o despertar das vocações depende em boa parte do testemunho pessoal e comunitário das pessoas que já deram ou estão dando sua resposta ao chamado de Deus. Creio que o testemunho de pessoas simples como Elena Gaboardi, italiana de Lodi que faz parte de uma associação leiga de apoio às comunidades de Nampula (Moçambique) e que recentemente visitou nossa missão em Mecuburi, e João Bertoldo, leigo calvarianos de Campinas, além de contribuírem de forma insubstituível na construção do Reino de Deus, são testemunhas vivas que despertam e sustentam vocações. Cristãos como estes – e eles são uma multidão que ninguém pode contar! – têm verdadeiramente o Cordeiro como pastor e Senhor.
“Eu as conheço e elas me seguem...”
A fé em Deus se mostra mais pelas ações que pelos ritos e palavras. É isso que Jesus afirma na discussão com as autoridades religiosas em plena festa da dedicação, em Jerusalém. Cercando Jesus, perguntam-lhe: “Até quando nos deixarás em suspenso? Se tu és o Messias, o Cristo, dize-nos abertamente!” E Jesus retruca: “Eu já vos disse, mas vos não acreditais. As obras que eu faço em nome do meu Pai dão testemunho de mim” (Jo 10, 24-25).
Jesus apresenta suas credenciais de Messias, de missionário do Pai: suas ações em favor da humanidade. Neste debate com as autoridades do judaísmo ele nega a legitimidade de uma fé que não tenha apoio no modo de agir. Quem está sem reservas ao lado do ser humano está com Deus. E quem está de alguma maneira contra o ser humano, mesmo que invoque o nome de Deus e participe de ritos religiosos, está contra ele.
“Somos seu povo e rebanho do seu pasto”, diz o salmista. Mas ser do rebanho de Jesus Cristo emplica em escutar sua Palavra e seguir seus passos, assumir sua pró-existência. Crer em suas obras de defesa e resgate da dignidade humana é até mais importante que crer na sua Palavra (cf. Jo 10,38). Crer em Jesus é segui-lo, dar continuidade à sua obra. “Eu as conheço e elas me seguem.” Seguir Jesus é entregar-se, como ele, sem reservas à luta pelo bem da humanidade, especialmente das pessoas humilhadas.
“Eu lhes dou a vida eterna.”
O denominador comum das múltiplas ações que expressam nossa fé é o amor. A autenticidade e a frutuosidade da nossa fé em Jesus não residem na multiplicação de atividades desconexas e sem alma. Mas muito mais que um sentimento, o amor é o dinamismo básico e permanente que nos move no reconhecimento do outro como outro, na defesa da sua dignidade inviolável e na priorização das suas necessidades humanas fundamentais, inclusive em detrimento das nossas.
O amor faz da nossa vida uma pró-existência, uma vida empenhada em favor dos outros. O amor é que nos faz humanos, nos dá à luz como pessoas. A descoberta e a construção da nossa identidade não se dá primariamente pela reflexão, pelo movimento de dobrar-se sobre si mesmo e escutar a voz interior, mas pela tomada de posição diante de uma voz externa que chama: “Aqui estou! Envia-me!” (Is 6,8). Uma vida assim vivida não pode ser tragada pela morte ou diminuída pelas ameaças: é re-suscitada sempre de novo, têm força de eternidade.
“Gente de todas as nações, tribos, povos e línguas...”
O amor autenticamente humano e cristão não reconhece nenhum tipo de fronteira. Enquanto pró-existência e afirmação da dignidade do outro enquanto outro, o amor rompe com os muros levantados em nome da religião, da raça, da classe, do sangue, dos interesses econômicos. O amor é o único dinamismo capaz de globalizar verdadeiramente o mundo, sem excluir ninguém, pois começa pelo diferente, pelo outro, pela exterioridade em relação a todos os sistemas e instituições.
Neste sentido é interessante o testemunho dos Atos dos Apóstolos, que mostra como Paulo e Barnabé conseguem abrir as fronteiras rígidas do judaísmo e estabelecem relações com os povos não-judeus. Partindo dos conflitos provocados pelo anúncio de Jesus Cristo dentro do judaísmo eles se voltam aos grupos considerados pagãos. Experimentando acolhida e respeito, os cristãos de origem não-judaica vivem uma grande alegria. E nem mesmo a perseguição consegue levar Paulo e Barnabé de volta à estreiteza dos laços étnicos e religiosos.
Mas aqui precisamos de novo lembrar que o amor não se resume a um princípio formal ou um sentimento interior. Sem deixar de ser uma opção fundamental e um horizonte iluminador e crítico, o amor não existe fora das infinitas e pequenas ações que o encarnam na realidade. Poderíamos dizer que o amor não existe em si mesmo, ele não é mas ‘vai sendo’ na imensa constelação de ações que afirmam e confirmam a vida e a dignidade das pessoas, começando pelas que nos são próximas e chegando àquelas que deslocamos para longe, como os índios, de cujo drama Galdino de Jesus, queimado vivo nas ruas de Brasília no dia 21 de abril de 1997, é um símbolo dramático.
“Muitos judeus e prosélitos praticantes seguiram Paulo e Barnabé.”
Se as palavras explicam e ilustram, o testemunho desperta e atrai. É claro que a mensagem anunciada por Paulo e Barnabé cumpre seu papel, mas é o testemunho de uma vida radicalmente mudada e colocada em risco que atrai judeus, prosélitos e gente vinda do paganismo. A mesma coisa podemos dizer a respeito da vocação e da con-vocação: a oração é importante, a pregação e o incentivo cumprem seu papel, mas o testemunho de uma vida ‘desvivida’ no amor eloquente e irresistível.
Na sua mensagem para o dia de hoje, o Papa Bento XVI apresenta Jesus Cristo como testemunha do amor de Deus por todas as pessoas sem distinção, mas com ‘especial atenção pelos últimos’. E diz que hoje Deus serve-se do testemunho dos padres e religiosos para suscitar novas vocações sacerdotais e religiosas. Tal testemunho se condensa especialmente na amizade e na intimidade pessoal com Cristo, no dom total de si mesmo a Cristo e no fazer-se companheiro de viagem de muitos irmãos e irmãs.
O Papa salienta que “o testemunho pessoal, feito de opções existenciais concretas” opera como encorajamento para que os/as jovens de hoje tomem “decisões empenhativas que envolvem o próprio futuro”. É vivendo com alegria a própria vocação de seguir Jesus Cristo que padres e religiosos/as chamam eloquentemente todos os cristãos a responderem à sua vocação universal à santidade. E para ajudá-los na própria resposta, a arte do encontro, do diálogo e do acompanhamento são essenciais.
“Vi uma multidão imensa que ninguém podia contar...”
Mas considerar como vocação unicamente a vida religiosa e o ministério sacerdotal é um erro teológico e pastoral (que o Papa não consegue evitar na referida mensagem). Rezando pelas vocações, pedimos a Deus que ajude nossas comunidades a se tornarem ambientes nos quais despertem e amadureçam as diversas vocações – leigas, religiosas e sacerdotais, litúrgicas e políticas – que ajudam a anunciar, celebrar e construir a utopia do Reino de Deus. Elas compõem uma multidão imensa que, orientando sua vida pelas sendas do Cordeiro, está de pé diante dele, pronta a cumprir a missão que ele lhe confia.
Nesta jornada mundial de oração pelas vocações, que vem sendo realizada há 47 anos, pedimos também que as autoridades eclesiásticas tenham a coragem de abrir novos caminhos e possibilidades ministeriais. Não seria um paradoxo enfatizar a necessidade da vida sacramental e, ao mesmo tempo, fazer os sacramentos dependerem unicamente de homens celibatários, dificultando assim o acesso do povo a eles? Faz sentido em pleno século XXI e diante de tanta necessidade excluir a metade fiminina da humanidade do acesso ao ministério ordenado?
“Serví ao Senhor com alegria!”
É através dos homens e mulheres que vivem sua vocação como serviço e compaixão que Deus estende hoje seu amor a todas as gerações, como diz o salmista. É mediante estas pessoas, a maioria delas anônimas, que Deus enxuga as lágrimas do seu povo. Oxalá nossa palavra e nosso testemunho ajude a Palavra e a obra libertadora de Deus chegar a todos os recônditos da terra. O Senhor nos fez, nos chamou e somos seus. Vamos a ele com alegria e realizemos a missão que ele nos confia com desvelo e criatividade: leigos/as ou consagrados/as, ordenados ou inseridos no mundo da política e da cultura, somos membros diferentes de um único corpo no qual bate um único coração.
Pe. Itacir Brassiani msf

terça-feira, 20 de abril de 2010

Encontro de Espiritualidade da VRI e Solidária

Nós, um grupo de 27 religiosas e cinco religiosos estivemos reunidos de 15 a 18 de abril na Casa de Oração São José, no Bairro Glória de POA para um encontro de espiritualidade da VRI e Solidária.
A necessidade deste encontro surgiu no ano passado no Seminário Estadual, quando então decidimos marcar este encontro para reflexão, oração, convivência e partilha.
O Encontro teve como Tema: ”Seguimento de Jesus Cristo na opção pelos pobres” e o objetivo de resgatar e aprofundar os fundamentos da espiritualidade da VRI.
Frei Wilson Dalagnol com sua maturidade, profundidade, humildade e com os “pés no chão” de uma comunidade inserida refletiu conosco as seguintes facetas da Inserção:
- Os preferidos de Deus;
- A Inserção evangélica no mundo da exclusão;
- A proximidade do mundo dos pobres (Documento de Aparecida);
- Traços da Espiritualidade;
- Práxis Libertadora da VRI e Solidária.
Foram dias abençoados. Realmente tivemos tempo para rezar, para partilhar e conviver. Com certeza saímos fortalecidas (os).

sábado, 17 de abril de 2010

A força do missionário Brota do seu amor a Jesus

(At 5,17-32.40-41; Sl 29/30; Ap 5,11-14; Jo 21,1-19)
Ao sabor do tempo pascal, redescobrimos o horizonte e a urgência da missão. As celebrações deste período nos ajudam a ajuntar os pedaços das múltiplas experiências e a compor um mosaico capaz de mostrar como Jesus ressuscitado se manifesta, onde se deixa encontrar. Mas revelam também as dificuldades que enfrentamos para organizar nossa vida a partir de um Deus crucificado e assimilar as exigências desta mesma fé. Neste terceiro domingo da páscoa somos convidados e meditar sobre a frequente frustração da missão e a nos interrogar sobre profundidade do nosso vínculo com Jesus Cristo, o missionário do Pai. A missão será tanto mais frutuosa quanto mais profundo for nosso vínculo com Jesus, pois sem ele não podemos fazer nada e secamos como um ramo cortado da árvore. Em todas as fases da missão precisamos perceber como o próprio Jesus se aproxima para nos alimentar com o Pão da sua vida e conferir o fundamento no qual assentamos nossa missão.
“Mas não pescaram nada naquela noite.”
Estimulados por Pedro, os sete discípulos, símbolo da comunidade aberta aos gentios, estão em plena missão. Aparentemente fazem tudo do jeito certo, mas a frustração pouco a pouco vai enchendo o barco e faz pesar o coração. “Não pescaram nada naquela noite.” Jesus lhes havia dito que era preciso realizar as obras de Deus enquanto é dia, porque “vem a noite, quando ninguém poderá trabalhar” (Jo 9,4). Brilhava a estrela d’alva e eles voltavam cansados, famintos e derrotados.
Por que o esforço deles se mostrava estéril? Não estaria faltando verdadeira união com Jesus Cristo? “Como o ramo não pode dar fruto por si mesmo, se não permanecer na videira, assim também vós não podereis dar fruto se não permanecerdes em mim” (Jo 15,4). Ou será que faltava colocar em prática a lição do despojamento radical? “Se o grão de trigo que cai na terra não morre, fica só. Mas, se morre, produz muito fruto” (Jo 12,24).
Talvez sejam estas também as causas de alguns dos fracassos pastorais da nossa Igreja. Fazemos planos arrojados e nos lançamos com vontade e generosidade na sua realização, mas não encontramos gosto e tempo para cultivar uma relação pessoal com Jesus Cristo e alimentarmo-nos na mesa da sua Palavra. Ou então atuamos como executores técnicos de uma obra entre outras tantas, sem empenhar nela a totalidade do nosso ser, sem comprometer nosso nome nem arriscar nela nossa inteira vida.
“Já de manhã, Jesus estava na praia, mas o discípulos não sabiam que era ele.”
Aquele grupo de generosos ativistas não tinha percebido nem reconhecido que Jesus continuava presente e próximo nas suas atividades missionárias. “Já de manhâ, Jesus estava na praia, mas os discípulos não sabiam que era Jesus.” Oprimida pelo fracasso, a comunidade se fecha e não consegue mais ver o essencial. Entretanto, Jesus continua se relacionando com eles com amizade e afeto, e isso se mostra na linguagem: “Filhinhos (ou rapazes), tendes alguma coisa para comer?”
A resposta dos discípulos é tão seca quanto a boca depois de uma noite de trabalho incessante. Com sua pergunta, Jesus acaba levando os discípulos a mergulhar no próprio fracasso. Mesmo que aqueles olhos cansados não conseguissem ver, Jesus Cristo continuava sendo uma presença discreta e fecunda nas idas e voltas da missão. Eles precisavam aprender a pescar diferente. Nós precisamos perceber e tornar sensível e reconhecível esta presença também hoje e mudar nosso modo de fazer as coisas.
“Lançai a rede à direita do barco...”
Obedecendo a Jesus, os discípulos recomeçaram o trabalho resignados, mas foram surpreendidos pelos resultados. Pegaram ‘uma multidão’ peixes. Será que não era exatamente ali, no lado direito do barco, que estava a ‘multidão’ de doentes, cegos, coxos e paralíticos que não conseguiam caminhar por si mesmos? Não seriam eles os primeiros interlocutores e beneficiados da missão da comunidade cristã? O segredo do êxito da missão da Igreja não estaria exatamente em voltar-se aos oprimidos?
De qualquer modo, os discípulos obedeceram à Palavra de Jesus Cristo e o trabalho deu frutos. Nesta obediência a Jesus Cristo está embutida uma relativização dos próprios conceitos e, frequentemente, uma desobediência às ordens vindas dos sistemas de coerção. Perseguidos, presos e ameaçados pelas autoridades do judaísmo, os apóstolos obedecem a Deus, deixam a prisão e, ao invés de fugirem, vão à praça e continuam intrepidamente a missão. “É preciso obedecer a Deus antes que aos homens.”
Os frutos inesperados do trabalho abrem os olhos para a presença de Jesus, mas só o discípulo amigo é capaz de reconhecê-lo e passar a notícia adiante. Então Pedro, fazendo as vezes de líder, ‘amarrou a túnica na cintura’ (como fizera Jesus no lava-pés!) e lançou-se no serviço. Todos foram recebidos com pão e peixe, mas o alimento oferecido por Jesus teve que ser completado pelo que eles produziram com o próprio trabalho. Ninguém perguntava pela identidade de Jesus, pois isso estava claro para todos.
“Tu me amas mais do que estes?”
No final da ceia pascal, depois de lavar os pés dos discípulos, Jesus perguntara: “Entendeis o que eu vos fiz?” (Jo 13,12) Agora, para arrematar a ceia à beira da praia, Jesus se dirige a Pedro perguntando: “Simão, filho de João, tu me amas mais que estes?” Interroga o líder do grupo e faz questão de sublinhar sua origem e sua expectativa de um Messias poderoso e bem-sucedido. No fundo, quer fazer Pedro revelar se sua pretensão de liderança tem motivação e horizonte evangélicos.
Aquele que pergunta é o Cordeiro imolado, o humilhado exaltado e confirmado por Deus. Só ele é digno de receber honra, glória e poder para sempre. E Pedro responde afirmando sua amizade por Jesus. Estaria ele lembrado das palavras ditas por Jesus na última ceia: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos. Vós sois meus amigos se fizerdes o que eu vos mando” (Jo 15,13-14)? De qualquer modo, sem amor pelo Cristo despojado e sem disposição de dar a vida pelo próximo não há autoridade evangelicamente legítima.
“Cuida dos meus cordeiros.”
A cada uma das três respostas afirmativas de Pedro, Jesus acrescenta um mandato: “Cuida dos meus cordeiros. Sê pastor das minhas ovelhas. Cuida das minhas ovelhas.” As variações evidenciam algumas ênfases e particularidades: providenciar segurança e alimento para os mais pequenos e humildes (cuidar dos cordeiros); liderar conduzindo à liberdade (pastorear as ovelhas); guiar à vida dando a própria vida (cuidar das ovelhas).
Enquanto a pesca representa uma atividade pastoral como que voltada para dentro, para as necessidades da comunidade eclesial, a missão confiada a Pedro e à comunidade cristã está voltada para fora, para as pessoas em geral. E em cada palavra, Jesus sublinha que as ovelhas e cordeiros são seus, e não de Pedro ou da Igreja. E se oferece como modelo e caminho para o exercício da missão.
Tanto as brasas ao calor das quais Jesus grelhou o peixe como a tríplice pergunta fazem Pedro lembrar sua falta de coerência no caminho da cruz. É como se, ao confirmar o mandato missionário que confere a Pedro e a cada um/a de nós, Jesus Cristo fizesse questão de recordar nossa vulnerabilidade. Mas ele quer também destacar outros dois elementos absolutamente fundamentais: não há autoridade legítima sem amor pessoal a Jesus Cristo, o Cordeiro imolado; não há amor a Jesus sem serviço aos pequenos.
“Segue-me.”
O encontro que começara com uma pesca frustrada, continuara numa refeição fraterna, se aprofundara num diálogo profundo e comprometedor, terminpu com um convite dirigido a Pedro: “Segue-me!” Até então Pedro havia acompanhado Jesus levado por outros, motivado por interesses ambivalentes. No evangelho de João, esta é a primeira vez que Jesus se dirige a Pedro convidando-o a ser seu discípulo. Depois do fracasso no caminho da cruz e na missão e depois da confirmação do seu propósito de ser amigo de Jesus e cuidar do seu rebanho, Pedro está maduro para iniciar o caminho de discípulo.
Só podemos ser testemunhas e missionários/as autênticos/as se permanecermos eternos discípulos/as e aprendizes, prontos/as a ir para onde o Senhor quiser nos levar. Cientes de que não produziremos frutos se não permanecermos unidos a ele, alimentamo-nos à mesa que ele nos prepara nos caminhos da história e nos descobrimos serenos/as e fortes, obedientes e livres para testemunhar um amor mais forte do que a morte, para seguir um humilhado no qual reside toda glória desejável e possível.
Pe. Itacir Brassiani msf

domingo, 11 de abril de 2010

Encontro dos frades das Obras Sociais de PoA e Canoas

Encontro dos frades que atuam nas obras sociais de Porto Alegre e Canoas

Data: 23/03/2010
Horário: 18 horas
Local: Fonte Colombo
Presentes: José Bernardi, Maicon Boccalon, Mauro Alves da Rosa, Luis Antonio Garbin, Luiz Carlos Lunardi, Maximino Tessaro, Zelmar Antonio Guioto, Edson Gilberto Antonio Cecchin, Alisson Bruneto, Álvaro Mores, Luciano de Souza Santos, Márcio Bachi, José Lagni.
Pauta: relato do desenvolvimento dos projetos, datas comuns, encaminhamentos práticos, avaliação do encontro com voluntários das obras sociais ocorrido em outubro de 2009. Avaliação do encontro: contou com expressiva participação dos voluntários, o formato celebrativo / recreativo favoreceu a integração, contudo, voluntários de uma das obras sociais sugerem que o encontro seja somente pela parte da manhã, destaque para o momento de partilha dos lanches. Fala de Frei Álvaro Mores: Para nós, obra social deve ser sinônimo de missão, as obras sociais são espaços em que exercemos nossa missionariedade. Eventuais tensões, críticas ou incompreensão referente a esse setor decorrem do fato de ser algo novo. Nossas obras sociais devem ser pólos irradiadores dos valores evangélicos. As obras sociais fazem parte de um projeto provincial, não é de alguém ou de uma fraternidade, mas da província toda. O provincial relatou ainda que o secretário geral do SEJUPE afirmou que a promoção da justiça, da paz e da ecologia deve se dar naturalmente em nossos projetos sociais, dispensando, portanto um projeto específico. Relato das atividades desenvolvidas nas obras sociais. Centro de Educação Popular São Francisco – Canoas: Constituiu uma equipe de coordenação, há proposta para instalação de cursos em comunidades e espaços da Rede de Comunidades São Pio X. Estão sendo estabelecidas parcerias com a prefeitura municipal de Canoas em vista de psicólogos, monitores e outros serviços. Há bom número de voluntários. A reunião com voluntários e equipe de coordenação ocorre sempre na última 5° feira do mês. Centro de convivências para idosos Santa Clara: manteve-se as mesmas oficinas do ano passado. Novos serviços: atendimento pessoal e informática. Foram feitas parcerias com CONAB e com a Defensoria Pública. Frei Maicon Boccalon veio a somar na equipe. Número de voluntários: 35. Acontecem reuniões periódicas com voluntários e equipe de coordenação. Ação solidária Santo Antônio: A relação paróquia / projetos sociais é vista com credibilidade. Atualmente há 18 projetos sociais em funcionamento. Destaque para os projetos de geração de renda como fabricação de fraldas descartáveis e sacolas ecológicas. Sente-se que há integração entre as obras sociais. Casas geriátricas estão sendo beneficiadas. Há muita procura pelos cursos oferecidos pela Ação Solidária Santo Antônio. Desafio: atender escolas públicas carentes.
Fonte Colombo: Contando voluntários, funcionários e freis há uma equipe de 48 pessoas. Há reuniões semanais com funcionários e freis e uma vez por mês reunião entre voluntários e freis. Meta 2010: aproveitar todas a estrutura e potencial da casa, dispor de voluntários para todos os serviços que a casa necessita. Procuramos dar atenção à saúde integral da pessoa. Todo o nosso agir está centrado no usuário. Está sendo formada uma equipe para o serviço de escuta. Temos serviços individuais e outros voltados para o coletivo, como as oficinas. Recebemos de fevereiro até agora mais de dez novos usuários. Resposta de Frei Álvaro a pergunta do Centro de convivência Santa Clara e do Centro de Educação Popular São Francisco a respeito do que a Província espera dessas obras: essas obras têm a mesma importância que qualquer outra. Contudo, é preciso estar ciente de que não precisamos fazer tudo, temos de ser os mediadores, favorecendo a criação de redes. E quando firmamos parcerias com órgãos públicos, precisamos dar atenção à transitoriedade do projeto em vista da sustentabilidade do mesmo. Programação 2010: Encontros bimestrais com freis que trabalham nos projetos sociais de Porto Alegre e Canoas estão previstos para as seguintes datas e locais: 11 de maio – Santa Clara; 03 de agosto – Santo Antonio; 09 de novembro – Centro São Francisco. Os encontros começaram às 18 horas e 30 minutos. Sugestão de data para encontro com voluntários de Porto Alegre ou Canoas: 29/05 ou 26/06. Comunicações: está sendo terminada a parceria com a CDI.

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Carta desde El Salvador, Povo e Igreja pascais

Carta desde El Salvador, Povo e Igreja pascais (16/03 a 04/04/2010)

Cheguei a El Salvador em 16 de março, a tempo de participar do congresso teológico na UCA (Universidad Centroamericana), e das bonitas celebrações do 30º aniversário do martírio de Monseñor Romero, que impactam bastante o coração.
Permaneço aqui até 21 de junho, com meu espanhol algo "torto", mas aprendendo cada dia um pouquinho mais, sobretudo quando me encontro com as crianças, que são muito boas mestras.
Não vim sozinho, pois sei que trago no coração muita gente querida a mim, e a quem El Salvador e sua Igreja “romeriana” são muito queridos. Por isso me sinto impelido a compartilhar o que venho vivendo por aqui.
Passei a Semana Santa com o povo simples das comunidades do interior do país, no departamento de Chalatenango (carinhosamente, Chalate): paróquia San Bartolomé, de Arcatao (comunidades Los Pozos, Huizucar, el Bajío, Carasque, etc), onde trabalha o Pe. Miguelito, SJ que, em sua juventude, esteve muito próximo a Romero, e que há anos tem acompanhado o povo pobre do interior. Passei também por San José las Flores e diversos outros rincões, cantones e pueblos. O Tríduo Pascal o celebrei com o povo de outra paróquia, em Las Vueltas (muitas voltas, aliás, entre montanhas). Foi um desimenso presente de Deus!, a que devo sempre me lembrar de agradecer.
Esse sertão salvadorenho é uma região que foi muito castigada pela guerra e massacres (ao todo, no país, há registro de 227 massacres a civis, com cerca de 10 mil pessoas assassinadas). As comunidades eclesiais eram muito visadas, a ponto de terem por vezes que manter escondida a Bíblia. Num encontro de oração para catequistas alguém formulou uma prece por quem, há não muitos anos atrás, arriscava-se para anunciar a Palavra de Deus (“matava-se a catequistas pelo fato mesmo de ser catequistas”). Por proximidade e fidelidade a seu povo e solidariedade às lideranças das comunidades (delegados da Palavra, coordenadores/as, membros das equipes litúrgicas,...), morreram, igualmente, religiosas, padres, e o bispo (Romero manifestou que seria triste que, numa Igreja com tantos mártires, não ocorresse isso, pois seria um mau sinal de que a hierarquia e a vida consagrada estariam longe de seu povo e sem compromisso efetivo com ele). Em El Salvador resplandece (ao lado também de infelizes exceções) uma Igreja perseguida e martirial, que segue muito viva e dinâmica, e na qual também as gerações mais jovens, das filhas e filhos da guerra, guardam a memória desse testemunho dos mais velhos e dos caídos/as, e dão continuidade a seus passos, neste novo contexto pós guerra civil e de albores de novos tempos.
Próximas à fronteira, tais localidades são, quase que na totalidade, repovoações, porque essa gente se refugiara em Honduras (compartilhando a Mesa Grande, significativo nome dum acampamento), deixando a região praticamente desabitada. Foram retornando ao fim da guerra ou, ao menos, quando os massacres se tornaram menos intensos; ou mesmo em meio a fortes enfrentamentos do exército com a guerrilha, mas para ajudar ativamente no processo de libertação de seu povo e permanecer ao lado dos/as parentes e amigos/as que haviam ficado, e correr juntos/as o mesmo risco. Sua consciência não lhes permitia viver longe do perigo, para proteger sua própria vida, pois a existência individual estava subordinada à vida do seu povo e era entendida na perspectiva do serviço a ele. Houve sim quem se incorporasse à guerrilha, em equipes de apoio ou mesmo como combatentes. É muito temerário, porém, emitir um juízo sobre isso, ainda mais quando se olha a realidade de fora. Certo: por princípio, não devemos ceder a nenhuma violência (Romero dizia que matar é mais fácil; difícil é morrer para que outros/as tenham vida). Contudo, diante da violência institucionalizada (e estando aqui, entendi melhor o significado palpável dessa expressão), a alternativa extrema passou a consistir entre se deixar matar em massa, ou assumir alguma forma possível de resistência. Para muita gente, entrar na guerrilha não foi uma escolha ideológica, mas uma opção pela sobrevivência coletiva. Miremos bem: não um esforço de garantia individual, que tantos/as foram mortos/as, mas a entrega de sua vida para que seu povo tivesse um futuro. Isso não anula as reais contradições da luta armada, seu substrato ideológico, etc. Porém situa a questão noutro horizonte: o povo não quer violência, mas também não está disposto a ser vítima passiva ante a insensibilidade e crueldade de quem detém o poder e absurdos privilégios.
Mesmo já conhecendo um pouco a história salvadorenha, não imaginava o quão terrível e brutal tenha sido a repressão às organizações populares e à Igreja comprometida com os/as pobres. Em cada família há cicatrizes, em cada casa há uma poça de sangue, às vezes de grande volume (sangue de 4, 5, 6, ou mais pessoas da mesma família). Romero não se cansou de profeticamente denunciar a violenta e sistemática repressão principalmente às indefesas famílias campesinas: o poder econômico da oligarquia já não se contentava com seu braço político a governar unicamente a seu favor (Romero ouviu de um agricultor, e o citou certa vez: “em nosso país a lei é como uma cobra, que só pica a quem anda descalço”), mas recorria à força militar e aos grupos para-militares e aos esquadrões da morte (“Orden”, “Mano Blanca”,...) que sem piedade espalharam terror, tortura, violações e assassínios.
No dia 14/05/1980, por exemplo, ocorreu o massacre do rio Sumpul, quando, próximo à localidade de Las Aradas, não tão longe de Las Vueltas, cerca de 600 civis, famílias inteiras (homens, mulheres, jovenzinhos/as, crianças, abuelos e abuelitas) das guindas - população desplazada, levas de gente migrante, em longas filas de caminhantes sem comida nem água, intentando atravessar o rio e chegar a Honduras - foram assassinados numa operação conjunta dos dois países, com apoio do imperialismo ianque (oficiais do exército salvadorenho, incluindo o Atlacatl, seu batalhão de elite responsável também pela morte dos 6 jesuítas da UCA, da funcionária Elba Julia e de sua filha Celina, de 15 anos, em 16/11/1989, foram treinados na Escola das Américas, dos EUA). No Sumpul, os disparos partiram de cada lado da fronteira, de modo que quem escapava de ser metralhado, sucumbiu por afogamento. Ouvi, que me contaram, com comoção, que alguns sobreviventes, que conseguiram subir em árvores e se mantiveram escondidos da vista de seus algozes, e a tudo presenciaram, depois (em seguida a re-encontrarem sua gente e relatarem o massacre) só puderam se quedar transtornados, ensandecidos pela dor...
Também ouvia, em Arcatao, noite adentro, um homem e um outro homem que, perambulando cada qual pelas ruas e pela praça, gritava sozinho palavras ininteligíveis, seus traumas.
Na beira das estradas há profusão de cruzes, não de vítimas de acidentes, mas a indicar os lugares, documentados ou presumíveis, de mais vidas roubadas. Aqui e ali há singelos monumentos em homenagem aos assassinados/as: letreiros com nomes, e fotos ou desenhos.
Hoje qualquer pessoa de 18 anos de idade ou mais (os Acordos de Paz datam de 1992) é sempre um(a) sobrevivente.
E acaso isso tudo não muda radicalmente o que seja a trajetória duma pessoa, e a de um povo?
Não faltam também os mutilados/as: um homem sem braço, à porta de sua casa; outro semi-paralisado por uma bala alojada na cabeça. Ou, como na foto do modesto museu que se vai organizando junto ao Centro de Formação da paróquia de Arcatao, uma jovenzinha apoiando-se em muletas, sua perna decepada (não longe da foto estão expostas roupas e chinelinhos de criança semi-destruídos, resgatados dos lugares de massacres). Ou (ao passarmos por um dado lugar) a evocação da criança que, atraída por uma espécie de lebre, pôs-se inocentemente, naquelas imediações, a correr atrás do animalzinho, e foi feita em pedaços, vítima fatal da explosão duma mina terrestre...
Cartazes, calendários de parede e camisetas estampam inúmeros desses rostos e nomes que não se esquecem.
Na igreja de Arcatao, ao fim da Missa, na 4ª-f Santa, a Moça vem, de longe, pela primeira vez, e se fotografa ao lado da imagem do Pai (próxima ao presbitério, a parede do templo, dum lado e doutro, mesclada à via-crucis de Cristo Jesus, é só de rostos e nomes de gente caída na guerra, para que a memória se mantenha viva e a morte não se prolongue, não se repita; para que a violência passe, e as flores e sorrisos fiquem): “Papai morreu na guerra quando eu era nenê. Não cheguei a conhecê-lo” (por detrás da abstração da guerra há histórias reais, pessoas de carne e osso, minha história única e irrepetível, e como agora a sinto, e como agora preciso ir reconstruindo-a, reconciliando-me com ela).
Na praça de Las Flores, na praça de Las Vueltas estão expostos restos da guerra (bombas que foram jogadas dos aviões e que não explodiram, metralhadoras retorcidas, baionetas que - deseja-se - para sempre caladas). Dilacerantes testemunhos a céu aberto.
...Não vou me alongar. Estou tomando algumas notas, e penso redigir um relato, não longo mas mais detalhado, desses dias salvadorenhos, salvadores, salvantes - esse povo crucificado e Servo, acostumado ao sofrimento, que vai tirando o pecado do mundo, que nos vai impulsionando à conversão. E que, no entanto, sorri largo, como se não tivesse sido obrigado a provar tanto fel. Sorri, espantosamente alegre, esperançoso, sem rancor, pondo-se a caminho para adiante. Querendo Justiça, sim, sem se resignar às forças de morte e a uma falsa reconciliação que equivaleria à impunidade e à aprovação de iniqüidades ou conivência com crimes assim abomináveis. A gente, contudo, sorri, acolhe, e mesmo perdoa, respirando Fortaleza e Esperança. Sua fisionomia, no entanto, mostra-se precocemente envelhecida, e mães aparentam ser as avós.
Uma Mãe vem ao meu encontro e seu sorriso a ela se adianta. Saúda-me com espontânea cordialidade. Vendo pendurado um quadro em sua homenagem, pergunto-lhe: “e a senhora também se dedicou muito para o bem de sua gente?” Sua resposta impressiona: “o primeiro que dei foi meu esposo e seis filhos”. Em verdade, sete: uma filha, cinco filhos, e mais uma filhinha que morreu enferma por falta de condições de ir atrás de atendimento médico, em meio às intermináveis peleias e a impossibilitação de circular pelas estradas.
Após semana tão realmente santa, porque passada junto a esse santo povo de Deus, agora sigo meu tempo de estudos, residindo novamente em San Salvador, na comunidade São Alberto Hurtado, com meus companheiros jesuítas. Na UCA, dos mártires Ignacio Ellacuría e companheiros, estou acompanhando o curso monográfico de Miguel Cavada sobre As homilias de Romero (Cavada foi quem organizou a edição crítica das homilias, em seis volumes), e as aulas de Cristologia, com Jon Sobrino. Além disso, vou fazendo minhas leituras, enquanto vou também vivendo outras experiências e conhecendo outras facetas da história dessa terra pascal que tanto sofreu com a amarga guerra, os massacres, a grande tribulação na qual lavaram e alvejaram suas vestes no sangue do Cordeiro (cf. Ap 7,14), mas que segue ressuscitando com o Cristo e construindo a cada dia, com Fé e Esperança, sua Vida Nova, na onipresença de San Romero de América, testemunha maior: “Não abandonarei meu povo, mas correrei com ele todos os riscos que meu ministério me exige” (11/11/1979; Homilias, vol. 5, p. 530); “a palavra fica, e esse é o grande consolo de quem prega: minha voz desaparecerá mas minha palavra, que é Cristo, permanecerá nos corações de quem a tiver querido acolher” (17/12/1978; Homilias, vol. 4, p. 65). Romero da mais profunda espiritualidade comprometida!, homem de Deus e do seu povo, a quem tendo-o amado, amou até o fim, até o extremo de ofertar a própria vida (cf. Jo 13,1).
“Com Romero, Deus passou por El Salvador” (palavras de Ellacuría, repetidas com freqüência por Jon Sobrino). O Cristo Ressuscitado segue passando em nossas vidas, também pela memória viva de Romero, ressuscitado no povo salvadorenho, e na de tantas outras vítimas. Que saibamos vê-Lo e ouvi-Lo, e nos pôr com firmeza a caminho!...


Pe. Rogério Mosimann da Silva, SJ

(05 de abril de 2010, 2ª-f da Oitava da, mais do que nunca, PÁSCOA)

Luzes pela Vida

A Aids existe e continua sendo um desafio para todos.
No Brasil, cerca de 630 mil pessoas vivem com HIV,
544.846 desenvolveram a doença e
217.091 já morreram em consequência da Aids.
Somos todos vulneráveis, portanto co-responsáveis no controle deste vírus.
A Vigília pelos Mortos de Aids quer:
Chamar a atenção para a realidade da epidemia;
Sensibilizar para o compromisso de buscarmos respostas a este problema que atinge a todos;
Convocar para uma ação de amor e compaixão, especialmente junto a quem é mais vulnerável;
Defender os direitos humanos e a dignidade das pessoas.
A qualidade de vida passa pela garantia dos direitos.

Oração pela Vida!

Senhor, fonte da vida e da esperança.
Estamos diante de Ti como criaturas frágeis e necessitadas.
Tu que amas tudo o que existe,
acolhe-nos em teu coração.
Recebe os que faleceram com Aids.
Confiantes em tua promessa,
cremos que a morte não é o fim!
Torna-nos defensores da vida,
perseverantes na luta,
solidários no sofrimento.
Livra-nos da discriminação,
liberta-nos do preconceito.
Sejamos acolhedores e misericordiosos,
conforme Tua vontade. Amém.